Ao longo de sua extensa história de mais de 100 anos, o cinema sempre procurou adaptar obras literárias produzindo filmes com roteiros inspirados em livros de variadas temáticas e autores de diferentes estilos. Mais especificamente no caso do cinema de horror, os escritores mais famosos e com um maior número de histórias adaptadas são Edgar Allan Poe e Howard Phillips Lovecraft, representando uma época mais antiga, e Clive Barker e Stephen King, que fazem parte de um período mais recente e moderno do Horror. King, inclusive, é o recordista em filmes inspirados em sua obra, pois de forma direta ou indireta ele tem participado do cinema fantástico por quase 40 anos e 70 filmes (incluindo produções para televisão, vídeo, curta-metragens e mini-séries). Esses quatro autores, mundialmente famosos por suas consagradas carreiras literárias, são personalidades marcantes também no cinema, fornecendo idéias, argumentos e histórias para a criação de filmes de horror e ficção científica que tem proporcionado entretenimento para os apreciadores do estilo e povoado por décadas a imaginação dos fãs com os piores pesadelos...
A filmografia baseada em obras de Stephen King geralmente é considerada de qualidade duvidosa, com a produção de dezenas de filmes que dividem a opinião dos fãs toda vez que são lançados, impulsionando invariavelmente grande movimentação em polêmicas listas de discussão pela internet, com significativa quantidade de elogios e principalmente críticas. Todas essas opiniões a favor ou contrárias são sempre muito subjetivas considerando-se a diferença natural entre um livro e um filme e devido a todas as conhecidas dificuldades em se adaptar uma obra literária para a tela grande.
Mas o que mais tem incomodado os fãs da obra literária de Stephen King e os apreciadores do cinema de horror em geral é que em muitos dos filmes lançados trazendo o nome de King como inspiração de seus roteiros, na verdade houve uma atitude oportunista e equivocada de seus produtores em ganhar promoção utilizando o nome consagrado do autor, pois a maioria desses filmes trazem histórias superficiais e muito pouco baseadas realmente nos argumentos originais de Stephen King, impulsionando até uma quantidade enorme de sequências descartáveis a partir de filmes originais que já haviam sido mal adaptados.
Outro erro cometido várias vezes pelos produtores foi a insistência em se filmar um conto curto de Stephen King num filme de longa metragem em vez de um episódio de menor duração (apesar que esse fato também aconteceu em muitos casos), obrigando os roteiristas a criarem novas situações em torno do argumento original, distanciando-se de sua proposta inicial com resultados na maioria das vezes não satisfatórios.
Porém, o mais importante para quem aprecia o gênero horror, a despeito de todos os problemas e mesmo exercendo uma análise crítica necessária e indispensável, uma sugestão é procurar se envolver com o principal objetivo do cinema: DIVERSÃO.
Após estrear nos Estados Unidos em 21/03/03, pouco menos de um mês depois, em 18/04, entrou rapidamente em cartaz nos cinemas brasileiros mais um filme inspirado numa história do “Mestre do Horror Moderno” Stephen King. Trata-se de “O Apanhador de Sonhos” (Dreamcatcher), dirigido por Lawrence Kasdan e com os experientes Morgan Freeman e Tom Sizemore no elenco, numa mistura de horror com elementos de ficção científica. O roteiro foi escrito por William Goldman, que já havia adaptado anteriormente outros dois livros de King para o cinema, “Louca Obsessão” (Misery, 1990) e “Lembranças de um Verão” (Hearts in Atlantis, 2001), produzidos pela “Castle Rock Entertaiment”.
Na pequena cidade de Derry, no Estado americano de Maine (terra natal de King e cenário de muitas de suas histórias), um grupo de quatro jovens amigos, Henry (Mike Holekamp), Jonesy (Giacomo Baessato), Beaver (Reece Thompson) e Pete (Joel Palmer) salvam um garoto deficiente mental e com poderes especiais telepáticos chamado Duddits (Andrew Robb) que estava sendo molestado por uma gangue de adolescentes. A partir desse incidente, o grupo de garotos recebe de Duddits como presente de gratidão um dom sobrenatural de premonição e uma capacidade de se comunicar telepaticamente, criando um forte vínculo entre eles e reforçando ainda mais a amizade existente.
Vinte anos depois, o grupo volta a se reunir numa cabana isolada numa floresta envolvida por tempestade de neve. Já adultos, o psiquiatra Dr. Henry Devlin (Thomas Jane), o professor universitário Gary “Jonesy” Jones (Damian Lewis), o vendedor de carros Pete Moore (Timothy Olyphant) e o marceneiro Joe “Beaver” Clarendon (Jason Lee) encontram um homem perdido na floresta com uma estranha e misteriosa doença que deixa uma marca vermelha no rosto, e cujo corpo serviu de incubadora para uma criatura mortal (numa referência ao clássico “Alien, o Oitavo Passageiro”, 1979, de Ridley Scott, e também pelo nome “Ripley” batizado como a doença alienígena, homenageando a famosa heroína de mesmo nome interpretada por Sigourney Weaver).
A partir daí, eles se envolvem novamente com o agora adulto paranormal Duddits (Donnie Wahlberg), presenciam e combatem uma tentativa de invasão alienígena e enfrentam um grupo especial de militares, liderados pelo austero Coronel Abraham Curtis (Morgan Freeman) e o Capitão Owen Underhill (Tom Sizemore), que isolam a área decretando estado de quarentena, e que secretamente estão investigando as ações dos alienígenas hostis no planeta já há vinte e cinco longos anos.
“O Apanhador de Sonhos” é mais um filme comum que situa-se apenas na média das dezenas de produções inspiradas em obras de Stephen King. O roteiro é até interessante, numa mistura de horror, ficção científica (com influências notáveis de filmes similares como “Invasores de Corpos”/1978 e “O Enigma de Outro Mundo”/1982, que por sua vez já eram refilmagens dos clássicos “Vampiros de Almas”/1956 e “O Monstro do Ártico”/1951, respectivamente), e uma forte amizade entre um grupo de jovens (tema que já havia sido bem explorado no filme “Conta Comigo”, de 1986). Mas sua trama é convencional num imenso desfile de clichês e situações previsíveis já vistas inúmeras vezes. Algumas cenas e diálogos propositadamente cômicos (principalmente a cargo do personagem Pete) são totalmente desnecessários. Em filmes sérios de horror o ideal seria evitar as tentativas equivocadas de inserir elementos de humor, a não ser em casos explícitos de paródia ou homenagem a outros filmes, como por exemplo os excelentes e super divertidos “A Volta dos Mortos-Vivos” (The Return of the Living Dead, 1985) e “Malditas Aranhas!” (Eight Legged Freaks, 2001), pois dificilmente o “crossover” entre horror sério e humor traz um resultado satisfatório.
Os personagens dos militares interpretados por Morgan Freeman e Tom Sizemore são arquétipos banais que não convencem, e que já foram explorados à exaustão pelo cinema, desperdiçando os talentos de seus experientes atores. Não faltou também o tradicional clichê de rivalidade entre as diversas organizações secretas do exército, envolvendo nesse caso um conflito particular do Coronel Curtis (Freeman) com o General Matheson (Michael O’Neill).
O personagem de Duddits, mesmo sendo deficiente mental, protagoniza alguns momentos difíceis de assimilar em atitudes que beiram o ridículo, principalmente na sua fase adulta. E seria interessante também uma redução na duração dos longos 136 minutos para algo em torno de pouco menos de duas horas, pois o filme não tem uma dinâmica capaz de sustentar a longa metragem.
De positivo, destacam-se uma cena inicial com o violento atropelamento do personagem Jonesy (interessante notar que o próprio Stephen King sofreu uma tragédia similar em sua vida em junho de 1999, e “Dreamcatcher” foi o primeiro livro publicado que ele escreveu após esse grave atropelamento que quase o matou); a bela fotografia de um ambiente de claustrofobia numa cabana no meio de uma floresta coberta pela neve (lembrando situação parecida com o hotel assombrado e isolado de “O Iluminado”, 1980); a interessante forma como foi apresentada a memória no cérebro do personagem Jonesy, dividida por setores e depósitos de arquivos pessoais (ele que havia sido possuído por um dos alienígenas); os eficientes efeitos especiais dos extraterrestres (destacando as asquerosas “enguias” assassinas, com suas bocas repletas de dentes afiadíssimos); a ótima sequência de ataque dos helicópteros do exército ao local do acidente de uma imensa e belíssima nave alienígena encravada na floresta, com seus tripulantes à deriva e tentando confundir as mentes dos pilotos da frota de ataque com mensagens de socorro; e o inevitável confronto final entre Duddits e um líder alienígena num desfecho revelador.
O título nacional foi bem escolhido, limitando-se a apenas traduzir corretamente o original em inglês, “Dreamcatcher” (ou “O Apanhador de Sonhos”). Aliás, os responsáveis pela definição dos nomes dos filmes estrangeiros no Brasil deveriam simplificar sempre seu trabalho e procurar apenas traduzir literalmente para o nosso idioma os títulos originais, com raras exceções onde torna-se necessário uma adaptação do nome nacional por questões comerciais.
O diretor Lawrence Kasdan é conhecido principalmente como roteirista de filmes de grande sucesso de público como “Os Caçadores da Arca Perdida” (1981), de Steven Spielberg, e dois episódios da primeira trilogia filmada da franquia “Star Wars”, criada por George Lucas, “O Império Contra-Ataca” (1980) e “O Retorno de Jedi” (1983). Na direção, foi o responsável por dois excelentes “westerns” modernos, “Silverado” (1985) e “Wyatt Earp” (1994), ambos com Kevin Costner.
Como curiosidade, é interessante mencionar que “Dreamcatcher” é realmente uma lenda indígena americana sobre “um filtro dos sonhos”, um aro de ramos entrelaçados numa complexa teia de fonte de energia, por onde passam os sonhos bons que viajam pela noite fluindo tranquilamente até as pessoas que dormem, e por onde também são aprisionados os pesadelos até sucumbirem com o final da noite e a chegada das primeiras luzes do dia.
E outro fato curioso foi que Stephen King cobrou simbolicamente apenas US$ 1,00 pelos direitos de produção do filme, procurando não se envolver com o roteiro, devido às várias experiências anteriores com adaptações de suas histórias para as telas e as quais não foram bem sucedidas, não contribuindo satisfatoriamente para seu legado de sucesso na literatura, pois muitos dos filmes inspirados em sua obra foram mal recebidos por seus fãs.
Enfim, “O Apanhador de Sonhos” não é um filme empolgante e nem destaca-se na filmografia de Stephen King. Mas ainda assim garante alguns bons momentos de diversão, numa história de horror e invasão alienígena. E também desperta um interesse especial principalmente por ser baseado em história do mestre do horror moderno.
Porém, em minha opinião os melhores filmes inspirados na consagrada obra literária de King continuam sendo os primeiros filmados há mais de 20 anos atrás como “Carrie, a Estranha” (Carrie, 1976) e principalmente “O Iluminado” (The Shining, 1980, dirigido por Stanley Kubrick e que estranhamente Stephen King não gostou, gerando uma curiosa polêmica entre eles na época); ou ainda mais recentemente como “O Cemitério Maldito” (Pet Sematary, 1989) e “Louca Obsessão” (Misery, 1990).
“O Apanhador de Sonhos” (Dreamcatcher, 2003) – avaliação: 5 (de 0 a 10)
site: www.bocadoinferno.com / blog: www.juvenatrix.blogspot.com (postado em 30/01/06)
O Apanhador de Sonhos (Dreamcatcher, Estados Unidos, 2003). Warner Bros. Duração: 136 minutos. Direção de Lawrence Kasdan. Roteiro de William Goldman e Lawrence Kasdan, baseado em obra homônima de Stephen King. Produção de Charles Okun, Jon Hutman, Stephen Dunn e Casey Grant. Produção Executiva de Bruce Berman. Fotografia de John Seale. Edição de Carol Littleton e Raul Davalos. Música de James Newton Howard. Maquiagem de William Corso. Efeitos Especiais de Les Bowie (“Industrial Light & Magic”). Elenco: Morgan Freeman (Coronel Abraham Curtis), Thomas Jane (Dr. Henry Devlin), Jason Lee (Joe “Beaver” Clarendon), Damian Lewis (Gary “Jonesy” Jones), Timothy Olyphant (Pete Moore), Tom Sizemore (Capitão Owen Underhill), Donnie Wahlberg (Douglas “Duddits” Cavell), Mike Holekamp (jovem Henry), Giacomo Baessato (jovem Jonesy), Reece Thompson (jovem Beaver), Joel Palmer (jovem Pete), Michael O’Neill (General Herman Matheson), Ingrid Kavelaars (Trish Oservich), Alex Campbell (Richie Grenadeau), Chera Bailey (Rachel Mendol), Shauna Kain (Josie Rinkenhauer), Campbell Lane (Gosselin), Ty Olsson (Sargento Andy Janas), Rosemary Dansmore (Roberta Cavell), Eric Keenleyside (Rick McCarthy).
A filmografia baseada em obras de Stephen King geralmente é considerada de qualidade duvidosa, com a produção de dezenas de filmes que dividem a opinião dos fãs toda vez que são lançados, impulsionando invariavelmente grande movimentação em polêmicas listas de discussão pela internet, com significativa quantidade de elogios e principalmente críticas. Todas essas opiniões a favor ou contrárias são sempre muito subjetivas considerando-se a diferença natural entre um livro e um filme e devido a todas as conhecidas dificuldades em se adaptar uma obra literária para a tela grande.
Mas o que mais tem incomodado os fãs da obra literária de Stephen King e os apreciadores do cinema de horror em geral é que em muitos dos filmes lançados trazendo o nome de King como inspiração de seus roteiros, na verdade houve uma atitude oportunista e equivocada de seus produtores em ganhar promoção utilizando o nome consagrado do autor, pois a maioria desses filmes trazem histórias superficiais e muito pouco baseadas realmente nos argumentos originais de Stephen King, impulsionando até uma quantidade enorme de sequências descartáveis a partir de filmes originais que já haviam sido mal adaptados.
Outro erro cometido várias vezes pelos produtores foi a insistência em se filmar um conto curto de Stephen King num filme de longa metragem em vez de um episódio de menor duração (apesar que esse fato também aconteceu em muitos casos), obrigando os roteiristas a criarem novas situações em torno do argumento original, distanciando-se de sua proposta inicial com resultados na maioria das vezes não satisfatórios.
Porém, o mais importante para quem aprecia o gênero horror, a despeito de todos os problemas e mesmo exercendo uma análise crítica necessária e indispensável, uma sugestão é procurar se envolver com o principal objetivo do cinema: DIVERSÃO.
Após estrear nos Estados Unidos em 21/03/03, pouco menos de um mês depois, em 18/04, entrou rapidamente em cartaz nos cinemas brasileiros mais um filme inspirado numa história do “Mestre do Horror Moderno” Stephen King. Trata-se de “O Apanhador de Sonhos” (Dreamcatcher), dirigido por Lawrence Kasdan e com os experientes Morgan Freeman e Tom Sizemore no elenco, numa mistura de horror com elementos de ficção científica. O roteiro foi escrito por William Goldman, que já havia adaptado anteriormente outros dois livros de King para o cinema, “Louca Obsessão” (Misery, 1990) e “Lembranças de um Verão” (Hearts in Atlantis, 2001), produzidos pela “Castle Rock Entertaiment”.
Na pequena cidade de Derry, no Estado americano de Maine (terra natal de King e cenário de muitas de suas histórias), um grupo de quatro jovens amigos, Henry (Mike Holekamp), Jonesy (Giacomo Baessato), Beaver (Reece Thompson) e Pete (Joel Palmer) salvam um garoto deficiente mental e com poderes especiais telepáticos chamado Duddits (Andrew Robb) que estava sendo molestado por uma gangue de adolescentes. A partir desse incidente, o grupo de garotos recebe de Duddits como presente de gratidão um dom sobrenatural de premonição e uma capacidade de se comunicar telepaticamente, criando um forte vínculo entre eles e reforçando ainda mais a amizade existente.
Vinte anos depois, o grupo volta a se reunir numa cabana isolada numa floresta envolvida por tempestade de neve. Já adultos, o psiquiatra Dr. Henry Devlin (Thomas Jane), o professor universitário Gary “Jonesy” Jones (Damian Lewis), o vendedor de carros Pete Moore (Timothy Olyphant) e o marceneiro Joe “Beaver” Clarendon (Jason Lee) encontram um homem perdido na floresta com uma estranha e misteriosa doença que deixa uma marca vermelha no rosto, e cujo corpo serviu de incubadora para uma criatura mortal (numa referência ao clássico “Alien, o Oitavo Passageiro”, 1979, de Ridley Scott, e também pelo nome “Ripley” batizado como a doença alienígena, homenageando a famosa heroína de mesmo nome interpretada por Sigourney Weaver).
A partir daí, eles se envolvem novamente com o agora adulto paranormal Duddits (Donnie Wahlberg), presenciam e combatem uma tentativa de invasão alienígena e enfrentam um grupo especial de militares, liderados pelo austero Coronel Abraham Curtis (Morgan Freeman) e o Capitão Owen Underhill (Tom Sizemore), que isolam a área decretando estado de quarentena, e que secretamente estão investigando as ações dos alienígenas hostis no planeta já há vinte e cinco longos anos.
“O Apanhador de Sonhos” é mais um filme comum que situa-se apenas na média das dezenas de produções inspiradas em obras de Stephen King. O roteiro é até interessante, numa mistura de horror, ficção científica (com influências notáveis de filmes similares como “Invasores de Corpos”/1978 e “O Enigma de Outro Mundo”/1982, que por sua vez já eram refilmagens dos clássicos “Vampiros de Almas”/1956 e “O Monstro do Ártico”/1951, respectivamente), e uma forte amizade entre um grupo de jovens (tema que já havia sido bem explorado no filme “Conta Comigo”, de 1986). Mas sua trama é convencional num imenso desfile de clichês e situações previsíveis já vistas inúmeras vezes. Algumas cenas e diálogos propositadamente cômicos (principalmente a cargo do personagem Pete) são totalmente desnecessários. Em filmes sérios de horror o ideal seria evitar as tentativas equivocadas de inserir elementos de humor, a não ser em casos explícitos de paródia ou homenagem a outros filmes, como por exemplo os excelentes e super divertidos “A Volta dos Mortos-Vivos” (The Return of the Living Dead, 1985) e “Malditas Aranhas!” (Eight Legged Freaks, 2001), pois dificilmente o “crossover” entre horror sério e humor traz um resultado satisfatório.
Os personagens dos militares interpretados por Morgan Freeman e Tom Sizemore são arquétipos banais que não convencem, e que já foram explorados à exaustão pelo cinema, desperdiçando os talentos de seus experientes atores. Não faltou também o tradicional clichê de rivalidade entre as diversas organizações secretas do exército, envolvendo nesse caso um conflito particular do Coronel Curtis (Freeman) com o General Matheson (Michael O’Neill).
O personagem de Duddits, mesmo sendo deficiente mental, protagoniza alguns momentos difíceis de assimilar em atitudes que beiram o ridículo, principalmente na sua fase adulta. E seria interessante também uma redução na duração dos longos 136 minutos para algo em torno de pouco menos de duas horas, pois o filme não tem uma dinâmica capaz de sustentar a longa metragem.
De positivo, destacam-se uma cena inicial com o violento atropelamento do personagem Jonesy (interessante notar que o próprio Stephen King sofreu uma tragédia similar em sua vida em junho de 1999, e “Dreamcatcher” foi o primeiro livro publicado que ele escreveu após esse grave atropelamento que quase o matou); a bela fotografia de um ambiente de claustrofobia numa cabana no meio de uma floresta coberta pela neve (lembrando situação parecida com o hotel assombrado e isolado de “O Iluminado”, 1980); a interessante forma como foi apresentada a memória no cérebro do personagem Jonesy, dividida por setores e depósitos de arquivos pessoais (ele que havia sido possuído por um dos alienígenas); os eficientes efeitos especiais dos extraterrestres (destacando as asquerosas “enguias” assassinas, com suas bocas repletas de dentes afiadíssimos); a ótima sequência de ataque dos helicópteros do exército ao local do acidente de uma imensa e belíssima nave alienígena encravada na floresta, com seus tripulantes à deriva e tentando confundir as mentes dos pilotos da frota de ataque com mensagens de socorro; e o inevitável confronto final entre Duddits e um líder alienígena num desfecho revelador.
O título nacional foi bem escolhido, limitando-se a apenas traduzir corretamente o original em inglês, “Dreamcatcher” (ou “O Apanhador de Sonhos”). Aliás, os responsáveis pela definição dos nomes dos filmes estrangeiros no Brasil deveriam simplificar sempre seu trabalho e procurar apenas traduzir literalmente para o nosso idioma os títulos originais, com raras exceções onde torna-se necessário uma adaptação do nome nacional por questões comerciais.
O diretor Lawrence Kasdan é conhecido principalmente como roteirista de filmes de grande sucesso de público como “Os Caçadores da Arca Perdida” (1981), de Steven Spielberg, e dois episódios da primeira trilogia filmada da franquia “Star Wars”, criada por George Lucas, “O Império Contra-Ataca” (1980) e “O Retorno de Jedi” (1983). Na direção, foi o responsável por dois excelentes “westerns” modernos, “Silverado” (1985) e “Wyatt Earp” (1994), ambos com Kevin Costner.
Como curiosidade, é interessante mencionar que “Dreamcatcher” é realmente uma lenda indígena americana sobre “um filtro dos sonhos”, um aro de ramos entrelaçados numa complexa teia de fonte de energia, por onde passam os sonhos bons que viajam pela noite fluindo tranquilamente até as pessoas que dormem, e por onde também são aprisionados os pesadelos até sucumbirem com o final da noite e a chegada das primeiras luzes do dia.
E outro fato curioso foi que Stephen King cobrou simbolicamente apenas US$ 1,00 pelos direitos de produção do filme, procurando não se envolver com o roteiro, devido às várias experiências anteriores com adaptações de suas histórias para as telas e as quais não foram bem sucedidas, não contribuindo satisfatoriamente para seu legado de sucesso na literatura, pois muitos dos filmes inspirados em sua obra foram mal recebidos por seus fãs.
Enfim, “O Apanhador de Sonhos” não é um filme empolgante e nem destaca-se na filmografia de Stephen King. Mas ainda assim garante alguns bons momentos de diversão, numa história de horror e invasão alienígena. E também desperta um interesse especial principalmente por ser baseado em história do mestre do horror moderno.
Porém, em minha opinião os melhores filmes inspirados na consagrada obra literária de King continuam sendo os primeiros filmados há mais de 20 anos atrás como “Carrie, a Estranha” (Carrie, 1976) e principalmente “O Iluminado” (The Shining, 1980, dirigido por Stanley Kubrick e que estranhamente Stephen King não gostou, gerando uma curiosa polêmica entre eles na época); ou ainda mais recentemente como “O Cemitério Maldito” (Pet Sematary, 1989) e “Louca Obsessão” (Misery, 1990).
“O Apanhador de Sonhos” (Dreamcatcher, 2003) – avaliação: 5 (de 0 a 10)
site: www.bocadoinferno.com / blog: www.juvenatrix.blogspot.com (postado em 30/01/06)
O Apanhador de Sonhos (Dreamcatcher, Estados Unidos, 2003). Warner Bros. Duração: 136 minutos. Direção de Lawrence Kasdan. Roteiro de William Goldman e Lawrence Kasdan, baseado em obra homônima de Stephen King. Produção de Charles Okun, Jon Hutman, Stephen Dunn e Casey Grant. Produção Executiva de Bruce Berman. Fotografia de John Seale. Edição de Carol Littleton e Raul Davalos. Música de James Newton Howard. Maquiagem de William Corso. Efeitos Especiais de Les Bowie (“Industrial Light & Magic”). Elenco: Morgan Freeman (Coronel Abraham Curtis), Thomas Jane (Dr. Henry Devlin), Jason Lee (Joe “Beaver” Clarendon), Damian Lewis (Gary “Jonesy” Jones), Timothy Olyphant (Pete Moore), Tom Sizemore (Capitão Owen Underhill), Donnie Wahlberg (Douglas “Duddits” Cavell), Mike Holekamp (jovem Henry), Giacomo Baessato (jovem Jonesy), Reece Thompson (jovem Beaver), Joel Palmer (jovem Pete), Michael O’Neill (General Herman Matheson), Ingrid Kavelaars (Trish Oservich), Alex Campbell (Richie Grenadeau), Chera Bailey (Rachel Mendol), Shauna Kain (Josie Rinkenhauer), Campbell Lane (Gosselin), Ty Olsson (Sargento Andy Janas), Rosemary Dansmore (Roberta Cavell), Eric Keenleyside (Rick McCarthy).