Colheita Maldita 3 (1994)


Com a idade vem a cegueira. Mas nós, jovens, somos os guardiões da visão da pureza. Aquele Que Anda Atrás das Fileiras nos deu esse dom para realizarmos seu desejo de limpar o mundo do mal. Será nossa maior colheita!” – parte de um discurso do pastor mirim Eli, orientando seus seguidores

Nem o próprio escritor Stephen King imaginava que seu despretensioso conto “As Crianças do Milharal”, publicado no livro “Sombras da Noite” (Night Shift), pudesse gerar uma série tão grande de filmes após o lançamento em 1984 de “Colheita Maldita” (Children of the Corn). A história das crianças que veneram uma entidade maligna que vive nos campos de plantação de milho e que induz seus seguidores ao assassinato brutal de todos os adultos até é interessante, mas não possui potencial para tanta badalação em torno do tema. De qualquer forma, a indústria do cinema decidiu investir na franquia e em 1994 foi produzido “Colheita Maldita 3” (Children of the Corn 3: Urban Harvest), dirigido por James D. R. Hickox.
Dois jovens irmãos órfãos, Eli (Daniel Cerny) e Joshua (Ron Melendez), deixam a pequena cidade de Gatlin, repleta de campos de milharais, e vão para Chicago, uma grande metrópole distante cerca de cem quilômetros. Lá, com a ajuda da assistente social Samantha (Yvette Freeman), eles são adotados por um empresário bem sucedido no ramo do comércio de agricultura, William Porter (Jim Metzler, de “Megiddo”), e sua esposa Amanda (Nancy Lee Grahn).
Apesar das dificuldades naturais de adaptação numa cidade grande, o irmão mais velho Joshua tenta fazer amizade com os novos vizinhos e colegas de escola, entre eles o jogador de basquete Malcolm Elkman (Jon Clair) e sua irmã Maria (Mari Morrow), apesar de enfrentar problemas com T-Loc (Garvin Funches), um idiota metido a valente. Já o mais novo Eli, faz questão de manter seus costumes do interior, utilizando sempre as mesmas roupas, se isolando das pessoas e trazendo consigo amostras de milho para serem plantadas num terreno de uma fábrica abandonada, nos fundos de sua nova casa.
Com o campo de milharal já crescido, Eli transforma-se num pastor mirim, pregando para seus colegas de escola, crianças e adolescentes, sobre a existência de uma entidade conhecida como “Aquele Que Anda Atrás das Fileiras”, a qual deveria ser idolatrada como um deus que tinha como objetivo proteger as colheitas, manter os incrédulos no inferno e banir o mal da terra incentivando a matança dos adultos. Para tentar combater suas pregações surge o padre Frank Nolan (o veterano Michael Ensign), que além de conduzir missas também é o diretor da escola. Porém, seu irmão Joshua também volta-se contra ele, principalmente depois de se apaixonar por Maria, e tenta impedir sua missão em catequizar os adolescentes para matar seus pais e espalhar as sementes de seu mestre pelo mundo.

O mundo prosperará e o deserto florescerá para Aquele Que Anda Atrás das Fileiras e seus filhos. Nós somos os escolhidos. Nós prosperaremos na terra, nos lares, nos corredores, nas salas, nos parques, até os incrédulos sentirem nossa ira e fúria quando triunfarmos sobre eles queimando a terra de dentro. Nós somos as sementes e agora é nossa vez de crescer. Os infiéis e incrédulos que passarem sobre ela serão consumidos. Abençoe meu coração com seus braços!” – discurso de Eli

Assim como na parte 2, esse terceiro episódio também não é ruim, principalmente pelo desfile de mortes violentas e muito bem produzidas, com direito até a uma carnificina bem sangrenta conduzida pela própria e tão temida entidade que “anda atrás das fileiras” dos campos de milho. Mas a idéia básica do filme é a mesma dos dois anteriores, o original de 1984 e a continuação de 1993, ou seja, apenas a ambientação foi alterada de uma cidade pequena do interior (Gatlin ou Hemmingford) para uma metrópole movimentada (Chicago). Continuamos tendo os mesmos elementos e clichês, um líder mirim para pregar a morte dos adultos, alguém metido a herói para tentar combater sua missão (nesse caso o irmão mais velho), um inevitável romance amoroso entre o herói e uma mocinha indefesa e vítima do monstro, e um monte de personagens criados para interagir com os principais, destinados apenas a morrer de forma violenta ou ajudar indiretamente nos objetivos obscuros do vilão (nesse caso, espalhar os milhos malignos pelo mundo, através de um trabalho de exportação dos grãos, começando pela Alemanha).
Um fator positivo e merecedor de registro é a presença do conhecido técnico em efeitos especiais de maquiagem Screaming Mad George na concepção do monstro, que parece uma daquelas criaturas indizíveis da literatura macabra de H. P. Lovecraft. Seu trabalho também pode ser conferido e apreciado nas várias cenas de mortes, porém na sequência final é inevitável perceber uma maior artificialidade dos efeitos, principalmente quando a imensa criatura demoníaca captura e ingere uma de suas vítimas. O desfecho é como sempre previsível (sempre sabemos com antecedência o que vai acontecer com o herói, a mocinha e o vilão), e também permite uma oportunidade para a continuidade da franquia com um enorme gancho para o desenvolvimento de outras seqüências.

“Colheita Maldita 3” foi lançado em DVD no Brasil com distribuição nas bancas de jornais, encartado na revista “DVD Premium” Ano 3, Número 34, Março de 2005, da “NBO Editora”, num disco de duas faces, onde no outro lado veio a parte 2 da série. Aliás, ainda foram produzidos mais quatro filmes no mesmo universo ficcional, “Colheita Maldita 4” (The Gathering, 96, de Greg Spence); “Colheita Maldita 5 – Campos do Terror” (Fields of Terror, 98, de Ethan Wiley); “Colheita Maldita 666 – Isaac Está de Volta” (Isaac’s Return, 99, de Kari Skogland); e “Colheita Maldita 7 – A Revelação” (Revelation, 2001, de Guy Magar).
A contra capa do DVD traz uma pequena sinopse ridícula e totalmente deslocada em relação ao verdadeiro conteúdo da história da terceira parte, numa completa falta de atenção dos responsáveis da editora que lançou o filme em DVD de banca. Como material extra temos apenas uma breve sinopse, que pelo menos é bem melhor que o texto colocado na contra capa.

Curiosamente, a bela atriz sul africana Charlize Theron, hoje consagrada pela participação em inúmeros filmes como “O Advogado do Diabo”, “O Poderoso Joe”, “15 Minutos”, “Encurralada” e “Monster – Desejo Assassino”, entre outros, aparece aqui em seu primeiro filme, numa ponta não creditada como uma das estudantes hipnotizadas, seguidoras de Eli em seu culto maligno. Ela não diz uma única palavra, mas já destaca-se por sua beleza exuberante em cena. A bíblia da seita que venera a entidade dos milharais é na verdade uma edição em capa dura do livro “Sombras da Noite” de Stephen King, apenas com a capa alterada para uma ilustração exaltando o milho como sagrado. O produtor executivo Anthony Hickox, irmão do diretor, também faz uma pequena participação não creditada (aliás, como cineasta ele dirigiu “Hellraiser III – Inferno na Terra”, entre outros filmes de horror). E o próprio diretor James D. R. Hickox fez uma breve citação de homenagem nos créditos finais para seu falecido pai Douglas Hickox, também cineasta e responsável pelo cultuado “As Sete Máscaras da Morte” (Theatre of Blood, 73), estrelado pelo ícone Vincent Price.

“Colheita Maldita 3” (Children of the Corn 3: Urban Harvest, 1994) # 306 – data: 26/03/05 – avaliação: 5 (de 0 a 10)
site: www.bocadoinferno.com / blog: www.juvenatrix.blogspot.com (postado em 18/01/06)

Essa é a noite da lua da colheita. As crianças devem deixar suas casas e todos os pertences mundanos para se juntarem com Aquele Que Anda Atrás das Fileiras. Nesta noite mataremos os adultos, limparemos a terra e purificaremos a colheita.

“Colheita Maldita 3” (Children of the Corn 3: Urban Harvest, Estados Unidos, 1994). Dimension Films. Duração: 90 minutos. Direção de James D. R. Hickox. Roteiro de Dode B. Levenson, baseado em conto homônimo de Stephen King. Produção de Gary DePew, Brad Southwick, Thomas C. Rainone e Donald Paul Pemrick. Produção Executiva de Anthony Hickox. Fotografia de Gerry Lively. Música de Daniel Licht. Edição de Chris Peppe. Desenho de Produção de Blair Martin. Maquiagem de Screaming Mad George. Elenco: Daniel Cerny (Eli Porter), Ron Melendez (Joshua Porter), Michael Ensign (Padre Frank Nolan), Jim Metzler (William Porter), Nancy Lee Grahn (Amanda Porter), Jon Clair (Malcolm Elkman), Mari Morrow (Maria Elkman), Yvette Freeman (Samantha), Garvin Funches (T-Loc), Duke Stroud, Rance Howard, Brian Peck, Nicholas Brendon.

Agradecemos Àquele Que Anda Atrás das Fileiras. Ele protege a colheita e mantém os infiéis no tormento do fogo eterno do inferno” – oração dita por Eli na mesa, antes de uma refeição