Halloween III - A Noite das Bruxas (1982)


O horror do Halloween continua na noite em que ninguém voltou para casa.

A franquia “Halloween”, criada em 1978 por John Carpenter, é uma das maiores da história do cinema de horror, contando com oito filmes, e o mais recente, “Ressurreição”, sendo produzido em 2002. Porém, um dos filmes da série não faz parte do universo ficcional que introduziu o psicopata mascarado Michael Myers para a galeria dos famosos e imortais vilões modernos do gênero. “Halloween III – A Noite das Bruxas” (Halloween III – Season of the Witch, 1982), de Tommy Lee Wallace, foi lançado pela mesma equipe que criou a franquia, porém apenas aproveitando o sucesso comercial do nome para contar uma história de horror completamente diferente da mitologia da série, com o único evento em comum sendo o fato de ser ambientada durante a época do tradicional “Dia das Bruxas” americano, no final de Outubro.
Mesmo sendo oficialmente um filme com a marca “Halloween” (ao contrário de uma infinidade de outros filmes que se apropriam indevidamente dos nomes de séries famosas para benefício próprio e interesses comerciais), esse terceiro episódio não traz nenhum dos personagens dos filmes anteriores, os quais eram a base da franquia, como a babá Laurie Strode (a scream queen Jamie Lee Curtis), o psiquiatra Dr. Sam Loomis (o veterano Donald Pleasence) e principalmente o psicopata Michael Myers (o dublê Dick Warlock, que voltou aqui, mas num outro papel menor). Esse fato acabou criando um sentimento incrível de rejeição por parte dos fãs, que certamente não era esperado pelos produtores, transformando o filme numa obra esquecida, abandonada, pouco comentada, muito criticada e relegada eternamente ao limbo dos filmes de horror.
Na verdade, “A Noite das Bruxas” é um filme injustiçado e não merece essa carga tão grande de desaprovação do público, pois apresenta uma história atrativa, que é independente do universo da série “Halloween”, mas que traz elementos interessantes de horror, com mortes violentas, se constituindo num bom exemplar do cinema do gênero produzido nos saudosos anos 1980. O único erro grave cometido por seus idealizadores foi certamente a utilização indevida do nome da famosa franquia, numa clara e oportunista atitude de marketing visando apenas o lucro que seria obtido. Talvez se o filme recebesse um nome alternativo desvinculado da série, seu destino poderia ser diferente, encontrando uma aceitação maior e um espaço garantido entre vários outros bons filmes produzidos no mesmo período.

O filme é ambientado no norte da California numa última semana de Outubro, antecedendo o tradicional “Halloween” (Dia das Bruxas), festa comemorada anualmente nos Estados Unidos, e com um enfoque voltado para um horror leve e sutil. O Dr. Daniel Challis (Tom Atkins) é um médico divorciado que enfrenta problemas com o alcoolismo e relacionamentos com sua ex-esposa Linda (Nancy Kyes), que reclama da falta de atenção aos seus dois filhos pequenos. Durante um plantão noturno no hospital, ele testemunha a chegada de um assustado velho ferido, Harry Grimbridge (Al Berry), que diz coisas estranhas e é assassinado no leito por um homem misterioso que se suicida com fogo logo em seguida. Intrigado com este acontecimento bizarro, o Dr. Challis recebe a visita da filha do velho assassinado, Ellie (a jovem e bela Stacey Nelkin), e juntos partem para uma investigação particular sobre o que aconteceu, culminando na chegada à pequena cidade de colonização irlandesa Santa Mira, local controlado por um poderoso e obscuro empresário, Conal Cochran (o irlandês Dan O´Herlihy), dono de uma fábrica de máscaras de Halloween, a “Silver Shamrock Corporation”.
Eles então entram em contato com algumas pessoas, entre elas o dono do hotel em que se hospedaram, Rafferty (Michael Currie), um igualmente visitante, o bem sucedido vendedor de máscaras em San Diego, Buddy Kupfer (Ralph Strait), e sua família, a esposa Betty (Jadeen Barbor) e o filho (Brad Schacter), uma outra forasteira cliente da fábrica de máscaras, Marge Guttman (Garn Stephens), e um bêbado falador, Starker (Jonathan Terry). A partir daí, uma série de mortes bem violentas começam a ocorrer numa provável ligação com a fábrica de Cochran e seus estranhos capangas de comportamentos suspeitos.
Após uma perigosa investigação, o Dr. Challis e Ellie se vêem obrigados a lutar por suas vidas numa sinistra trama diabólica onde o maquiavélico Cochran, através de sua fábrica de máscaras mortais de Halloween, planeja ressuscitar um antigo ritual de sacrifício envolvendo forças sobrenaturais de uma pedra roubada do santuário de “Stonehenge”, espalhando o terror em um sangrento infanticídio no “Dia das Bruxas”, ao implantar nas máscaras das crianças um pequeno dispositivo computadorizado com uma amostra da pedra mística.

"Halloween III" tem uma história interessante, com elementos de puro horror, magia negra, assassinatos brutais, a figura do tradicional vilão tipo “cientista louco”, e até ficção científica na introdução de avançados andróides como importantes coadjuvantes na trama. As cenas de mortes são bem planejadas e memoráveis com direito a olhos esmagados, cabeça decepada, rosto desfigurado, insetos e cobras saindo do crânio, cabeça perfurada com uma broca, e uma dose de violência que não fica atrás de vários filmes cultuados e produzidos na mesma época.
A música tema da propaganda das máscaras na televisão, aparece tantas vezes ao longo do filme, que acabamos gravando sua melodia na mente, e associando sua imagem a uma idéia de tragédia com um massacre de crianças cantando vestidas com as máscaras que lhe tirariam a vida violentamente (“Happy, Happy Halloween, Silver Shamrock”).
Os enormes computadores e painéis elétricos do laboratório central da fábrica de máscaras trazem lembranças dos antigos filmes de ficção científica dos anos 1950 e 60, com seus aparelhos repletos de luzes piscando para todos os lados.
Uma sequência em especial demonstra bem a insanidade e propósitos maléficos do vilão Cochran, como um verdadeiro e sinistro “cientista louco” planejando suas atrocidades, quando revela para o Dr. Challis suas intenções:

Era o início do ano em nossas terras celtas e esperávamos em nossas casas de madeira e barro. Não havia mais barreiras entre o real e o irreal. E os mortos estavam à espreita para sentar perto do fogo. Dia das Bruxas. O festival de Samhain. O último aconteceu há mais de 300 anos e as montanhas ficaram vermelhas com o sangue de animais e de crianças.

O desfecho de “Halloween III” foge do tradicional, e mesmo sendo um pouco previsível a história se conclui de forma satisfatória no ato desesperado do Dr. Challis em tentar avisar as autoridades sobre o desastre que estaria por vir.
Porém, uma falha bastante notável, e que curiosamente já havia acontecido também no filme anterior, dirigido por Rick Rosenthal em 1981, foi a ausência de movimentação no hospital, mesmo durante à noite, permitindo que um assassino transite tranquilamente por seus corredores, mate um paciente e saia sem maiores dificuldades.

Curiosamente, o ator Dick Warlock, que interpretou o psicopata Michael Myers nos dois primeiros filmes da saga, não precisando falar uma única palavra, voltou novamente em “Halloween III”, numa provável cortesia dos produtores, fazendo um papel similar, na pele de um assassino, além também de ser o coordenador dos dublês e atuar como um deles. E o diretor Tommy Lee Wallace, seguindo a interessante idéia já muito utilizada pelo cineasta Alfred Hitchcock em seus filmes, também faz uma rápida aparição não creditada, como um anunciante de comercial.
Outras curiosidades interessantes incluem um momento em que o Dr. Challis está num bar onde a televisão está ligada e exibindo um desenho animado. Ele pede para mudar de canal e aparece rapidamente uma cena do primeiro filme da saga, “Halloween – A Noite do Terror”, com a imagem de Michael Myers descendo uma escada, e com o filme sendo apresentado como um “clássico imortal” oferecido pela propaganda que vem logo em seguida, das máscaras de Halloween da obscura empresa “Silver Shamrock”. Em outra sequência, quando o mesmo médico está preso e amarrado numa sala sendo obrigado a usar uma das máscaras mortais, é induzido a ver uma televisão ligada onde rapidamente aparece outra cena de filme anterior, só que dessa vez com Jamie Lee Curtis.
Em Outubro de 2003, “Halloween III” foi lançado no Brasil em DVD, num disco duplo junto com “Halloween II”, pela revista “DVD Premium” ano 3 número 29, da “nbo Editora”, com distribuição em bancas e um preço popular. Só que infelizmente houveram muitas falhas, começando pelos paupérrimos extras. No terceiro filme da saga, os extras são apenas uma sinopse curta e muito mal feita, e pequenas filmografias dos atores Tom Atkins e Stacey Nelkin. O filme foi batizado de forma errada como “Halloween III – A Noite do Terror”, quando o correto é “A Noite das Bruxas” (conforme lançamento anterior no Brasil já com esse nome), sem contar que o subtítulo adotado dessa vez é justamente o mesmo do primeiro filme de John Carpenter, de 1978. Que confusão desnecessária... bastava fazerem uma pesquisa prévia para evitarem esses erros. Outro equívoco é chamar o assassino da saga de Mike Myers (não confundir com o ator comediante homônimo), tanto num artigo da revista como na sinopse da capa do DVD, sendo que nunca durante a franquia se referiram ao psicopata dessa forma mais íntima e sim como seu nome Michael Myers. E os erros não param por aí, e apenas para tentar impressionar os consumidores fãs do Horror, ambos os filmes estão anunciados na capa do DVD como “Dois clássicos do terror agora em um único DVD!”. Os filmes são muito bons e valem a aquisição pelos colecionadores, apesar de todos os erros cometidos pela editora, mas chamá-los de clássicos é exagerado e equivocado, numa falta de respeito com os fãs, os quais a editora pensa que está enganando. A quantidade de erros cometidos no caso de “Halloween II” não é menor, e para se ter uma idéia disso basta ver a capa do DVD anunciando o filme como sendo de John Carpenter, quando o diretor foi Rick Rosenthal, e a participação de Carpenter foi na autoria do roteiro e produção.

Tommy Lee Wallace fez sua estréia na direção com “Halloween III”, e sua participação no gênero ainda inclui os filmes “A Hora do Espanto 2” (1989) e “It – Uma Obra-Prima do Medo” (1990, baseado em obra de Stephen King), e mais recentemente com “Vampiros: Os Mortos” (2002), continuação do filme “Vampiros” (1998), de John Carpenter. E em 1982 ele foi o roteirista de “Amityville 2”.
O ator americano Tom Atkins nasceu em 1935 em Pittsburgh, Pennsylvania, e entre seus filmes destacam-se trabalhos em “A Bruma Assassina” (1980) e “Fuga de Nova York” (1981), ambos também de John Carpenter, “Terror nas Sombras” (1985), “Noite dos Arrepios” (1986), o policial “Máquina Mortífera” (1987) e “Maniac Cop” (1988). A partir do final dos anos 80, ele se dedicou mais em trabalhos voltados para a televisão, entre filmes e séries.

A feitiçaria entra na era da computação, e um terror diferente inicia

“Halloween III – A Noite das Bruxas” (Halloween III – Season of the Witch, 1982) – avaliação: 6,5 (de 0 a 10)
site: www.bocadoinferno.com / blog: www.juvenatrix.blogspot.com (postado em 10/01/06)

Halloween III – A Noite das Bruxas (Halloween III – Season of the Witch, Estados Unidos, 1982). Duração: 96 minutos. Direção de Tommy Lee Wallace. Roteiro de Tommy Lee Wallace e Nigel Kneale (não creditado). Produção de John Carpenter e Debra Hill. Produção Executiva de Moustapha Akkad, Joseph Wolf e Irwin Yablans. Música de John Carpenter e Alan Howarth. Fotografia de Dean Cundey. Edição de Millie Moore. Elenco: Tom Atkins (Dr. Daniel Challis), Stacy Nelkin (Ellie Grimbridge), Dan O’Herlihy (Conal Cochran), Michael Currie (Rafferty), Ralph Strait (Buddy Kupfer), Jadeen Barbor (Betty Kupfer), Brad Schacter (Buddy Kupfer Jr.), Garn Stephens (Marge Guttman), Nancy Kyes (Linda Challis), Jonathan Terry (Starker), Al Berry (Harry Grimbridge), Wendy Wessberg (Teddy), Essex Smith (Walter Jones), Maidie Norman (Enfermeira Agnes), John MacBride (Xerife), Loyd Catlett (Charlie), Paddi Edwards, Morman Merrill, Patrick Pankhurst, Dick Warlock, Martin Cassidy, Michelle Walker, Joshua John Miller, Jeffrey D. Henry, Michael W. Green.