“Grandes demônios do inferno. Olhai pelos membros do círculo. Dê a eles o seu poder sobre a humanidade. Nós, que nos dedicamos a servi-lo e a obedecê-lo, aceitamos a sua orientação e o seu poder absoluto. Os monstros sem nome das profundezas o chamam”. – Trecho de um ritual satânico
A consagrada e cultuada produtora inglesa de filmes fantásticos “Hammer” foi a responsável pelo ressurgimento do Horror no final da década de 1950, quando trouxe novamente às telas do cinema os famosos monstros sagrados “Drácula”, “Criatura de Frankenstein”, “Múmia”, “Fantasma da Ópera”, “Lobisomem”, entre outros, os quais haviam sido largamente filmados em preto e branco pela saudosa produtora americana “Universal”, com Boris Karloff, Bela Lugosi e Lon Chaney Jr. Porém, dessa vez com fotografia colorida, foi produzida uma infinidade de clássicos como “A Maldição de Frankenstein” (1957) e “O Vampiro da Noite” (1958), lançando atores que se transformaram em ícones absolutos do gênero como Christopher Lee e Peter Cushing.
O ápice de sucesso da “Hammer” foi durante os nostálgicos anos 60, sendo que de uma forma inevitável suas produções acabaram se desgastando com o passar dos anos, com poucas novidades e uso exagerado de fórmulas repetitivas e clichês exaustivamente explorados, perdendo o interesse do público e culminando com uma safra de filmes de menor expressão a partir do início de 1970 até meados dessa década, com o fim das atividades da produtora. Para tentar recuperar o prestígio perdido, a “Hammer” procurou alterar a tradicional ambientação gótica de seus filmes de vampiros transportando as ações para um tempo mais moderno, atualizado com a época da produção, trocando os imponentes castelos, as pequenas e isoladas aldeias e as carruagens pelos enormes prédios e automóveis da tumultuada vida urbana da Inglaterra dos anos 70.
O primeiro exemplo dessa mudança de estilo ocorreu em 1972 com o filme de título estranho “Drácula no Mundo da Mini Saia” (Dracula AD 1972), seguido logo após por “Os Ritos Satânicos de Drácula”, dirigido por Alan Gibson, misturando elementos de vampirismo com rituais satânicos, um tema em moda e muito bem explorado na época com o clássico “O Exorcista” (1973) e outros filmes similares abordando histórias de demônios e ocultismo como “Balada Para Satã” (1971), “O Feiticeiro” (1972) e “O Anticristo”, produção italiana de 1974.
Novamente com a dupla Christopher Lee e Peter Cushing, respectivamente como o vampiro “Drácula” e o seu histórico inimigo, o antropólogo Prof. Van Helsing, “Os Ritos Satânicos de Drácula” é o oitavo filme com o personagem de uma longa série iniciada com “O Vampiro da Noite”, e com Lee interpretando pela última vez para a “Hammer” o papel do “príncipe das trevas” que o consagrou para sempre, transformando-o no principal vampiro da história do cinema, juntamente com o lendário Bela Lugosi.
Dessa vez, a história traz o malevolente vampiro “Drácula”, reencarnado na figura de um empresário milionário chamado D. D. Denham (Christopher Lee), envolvido numa conspiração satânica para tomar o poder no mundo. Um agente do serviço secreto britânico, Hanson (Maurice O’Connell), está investigando as ações misteriosas de uma seita demoníaca liderada pela sacerdotisa vampira Chin Yang (Barbara Lu Ying), que realiza rituais de satanismo na imensa mansão “Pelham House” nos arredores de Londres, um local de reuniões de um suposto grupo de pesquisas paranormais. Porém, ele é capturado e brutalmente espancado e torturado, por descobrir que os responsáveis pelos ritos de magia negra são poderosos cidadãos da sociedade inglesa. Uma vez conseguindo escapar ele passa as informações da investigação para seus superiores, o Inspetor Murray (Michael Coles) e Peter Torrence (William Franklyn), que solicitam auxílio ao antropólogo Prof. Van Helsing (Peter Cushing), renomado cientista especialista em ocultismo e vampirismo, cuja missão histórica de sua família sempre foi a de caçar vampiros.
Eles descobrem uma trama diabólica envolvendo um grupo seleto de importantes homens formado por um militar, General Freeborne (Lockwood West), um empresário latifundiário, Lord Carradine (Patrick Barr), um ministro do serviço de segurança, John Porter (Richard Matthews), e um cientista, Prof. Julian Keeley (Freddie Jones), todos manipulados pelo empresário D. D. Denham, o próprio Drácula, para espalharem um vírus letal na humanidade e lançar o mundo num caos de destruição. Eles seriam os novos “Quatro Cavaleiros do Apocalipse”, os emissários da peste negra que trariam a morte para a civilização humana.
Após o sequestro de sua bela sobrinha Jessica (Joanna Lumley), pelos capangas de Drácula, um grupo de motoqueiros rebeldes típicos dos anos 70, com o objetivo de utilizá-la num ritual satânico de sacrifício, o Prof. Van Helsing é obrigado a interferir e juntamente com o Inspetor Murray tentar o resgate da moça, sendo inevitável um confronto final com o histórico inimigo vampiro.
“Os Ritos Satânicos de Drácula” está bem longe dos melhores da série de filmes de vampiros da “Hammer”, tendo como principal referência o insuperável “O Vampiro da Noite”. A intenção de alterar a ambientação para tempos mais modernos foi sem dúvida uma estratégia comercial viável da produtora em decadência, mas ainda acho preferível os tradicionais elementos góticos presentes nos filmes anteriores, como os fascinantes castelos em ruínas à beira de penhascos, as árvores fantasmagóricas, os cemitérios macabros, a assustadora névoa espessa da floresta, os pequenos vilarejos com seus aldeões supersticiosos, e tudo aquilo que representa historicamente um horror sobrenatural à espreita, escondido nas sombras e pronto para atacar inesperadamente. A idéia de inserir rituais satânicos num mundo moderno também é muito boa, mas funcionaria melhor se não tivesse relação com o tradicional vampiro Drácula, na forma como foi idealizado pelo escritor Bram Stoker em sua obra homônima de 1897.
Porém, a despeito desses pequenos inconvenientes, o filme garante ótimos momentos de entretenimento destacando algumas sequências interessantes como o momento onde Jessica é atacada por um grupo de jovens e belas vampiras escravas de Drácula, que estavam aprisionadas em seus caixões numa cripta próxima à mansão onde eram realizadas as missas negras; a forte cena de agonia de um dos discípulos do “mestre das trevas” quando foi infectado pelo vírus que causa o lento apodrecimento de seus músculos, queimando sua pele em um terrível tormento, mergulhando na imensa dor de feridas pútridas; e o esperado desfecho com o confronto final entre Drácula e Van Helsing (o último duelo entre Christopher Lee e Peter Cushing em filmes de vampiros pela “Hammer”, após 15 anos).
Em contrapartida, três falhas em “Os Ritos Satânicos de Drácula” são bem notáveis. Uma é quando o Prof. Van Helsing está preparando uma bala de prata para seu inimigo vampiro, e logo após fundir o projétil num molde ele pega-o com as mãos para carregar seu revólver, ignorando o fato que a alta temperatura do mesmo fatalmente queimaria seus dedos. Outra situação forçada demais ocorre na cena quando Van Helsing reconhece a real identidade do empresário D. D. Denham, numa série de diálogos e atitudes inverossímeis, onde fica claro que o roteirista não se preocupou em desenvolver uma sequência mais inteligente e criativa. E por fim, faltou uma lógica para a atitude de Drácula em querer espalhar um vírus devastador na humanidade, pois dessa forma ele dizimaria todo o planeta eliminando a sua própria fonte de alimento que é o sangue de suas vítimas, parecendo que foi um ato de auto destruição por estar cansado da maldição de viver eternamente em seus incontáveis ciclos de morte e renascimento. Drácula é um ser poderoso e imponente e o roteirista foi infeliz em evidenciar sua covarde intenção de acabar com tudo, inclusive ele próprio.
Mas o roteiro de Don Houghton também está repleto de ótimos momentos de puro horror, exaltando a supremacia do Mal absoluto e dando ênfase à decadência total da humanidade, envolvida na paranóia de sua própria irracionalidade. Como por exemplo nas antológicas palavras depressivas do atormentado Professor Keeley, especialista em doenças do sangue, ao seu amigo de ciências, o antropólogo Van Helsing, tentando justificar sua atitude de desenvolver e aperfeiçoar um vírus letal similar à peste bubônica ou “morte negra” que arrasou a humanidade no passado, e que seria utilizado para contaminar o mundo e espalhar a morte no planeta:
“O mal comanda. É verdade. O mal e a violência são as únicas medidas poderosas. Olhe para o mundo, um caos. É um padrão pré-ordenado. Violência, ganância, intolerância, aversão, culpa. Os pecados mortais. Ou virtudes mortais. O ser supremo é o Diabo. Obedeça-o e ganhará a imortalidade. Ele acaba com a morte, o inimigo comum. Nada é suficientemente vil, nada é tão repulsivo, tão horrível. Você precisa conhecer o terror, o horror. Precisa sentir a maravilha da repugnância, a beleza da obscenidade.”
Ou ainda na mórbida definição descrita pelo cientista Van Helsing, ao se referir ao temível Conde Drácula:
“A força real é mais sinistra, mais obscena do que qualquer monstruosidade que imaginam. Lorde da Corrupção. Mestre dos Mortos-Vivos. O Conde Drácula.”
Christopher Lee aparece apenas em poucas cenas, mas ainda assim sua presença é marcante encarnando o imortal e amaldiçoado vampiro “Drácula”. Ele, que em seus 80 anos de idade e mais de 300 filmes no currículo, ainda está na ativa e participando como vilão de duas das mais expressivas franquias do cinema de entretenimento do momento, “Star Wars”, como o Conde Dookan, e “O Senhor dos Anéis”, interpretando o mago Saruman.
O ator inglês Peter Cushing faleceu em 1994 aos 81 anos de idade após participar de quase 100 filmes, e em sua vasta carreira no cinema as performances mais notáveis foram no gênero fantástico, onde acabou recebendo dos críticos e fãs o nobre título de “O Cavalheiro do Horror”, devido a sua natural postura aristocrática. Um de seus papéis mais significativos foi justamente como o famoso caçador de vampiros “Prof. Van Helsing”, personagem que encarnou inúmeras vezes, e que acabou associando-se a sua imagem.
“Os Ritos Satânicos de Drácula” recebeu o título original de “The Satanic Rites of Dracula” para lançamento nos Estados Unidos, sendo que na Inglaterra seu nome foi “Count Dracula and His Vampire Bride”. E, sem dúvida nenhuma, o nome americano é bem melhor e mais coerente com a história do filme, que mescla basicamente vampirismo com satanismo.
Como curiosidade, vale confirmar os tradicionais meios descritos no filme para se matar um vampiro, os quais já são bem conhecidos pelos fãs: símbolos do Bem combatem a força do Mal, como a cruz, e a palavra de Deus escrita na bíblia, a água pura e corrente que simboliza pureza, uma bala de prata, uma estaca de madeira no coração, a luz do dia, e os espinhos dos arbustos.
A data escolhida por Drácula para disseminar o vírus da peste negra na humanidade foi um especial dia 23, na comemoração do sabá dos mortos-vivos. Segundo o filme, existem círculos satânicos que governam nossa fé e regem o universo. Através da história da humanidade, existiram certas datas onde houveram grandes catástrofes, e uma vez estudadas por especialistas chegou-se à conclusão que existe um padrão definido descrevendo que os grandes desastres sofridos pela raça humana ocorreram nos períodos onde os círculos satânicos se cruzavam. No século XX houveram duas guerras mundiais e o dia 23 do mês sabático é a satânica celebração da blasfêmia suprema, o sabá dos mortos-vivos, a data ideal para o apocalipse.
“Grandes demônios do inferno. Olhai por seus discípulos. Dê-lhes poder sobre a humanidade. Nós que nos dedicamos a servi-lo e obedecê-lo. Com esse batismo de sangue seguiremos os passos eternos dos amaldiçoados para conhecer os segredos dos que atravessaram a fronteira do desconhecido até as margens do ódio.”
“Os Ritos Satânicos de Drácula” (The Satanic Rites of Dracula, 1973) – avaliação: 7 (de 0 a 10)
site: www.bocadoinferno.com / blog: www.juvenatrix.blogspot.com (postado em 10/12/05)
Os Ritos Satânicos de Drácula (The Satanic Rites of Dracula / Count Dracula and His Vampire Bride, Inglaterra, 1973). Hammer. Duração: 88 minutos. Lançado no mercado brasileiro de vídeo DVD pela Revista Dark Side (Editora MultiMedia Group). Direção de Alan Gibson. Roteiro de Don Houghton, baseado em personagem criado por Bram Stoker. Produção de Roy Skeggs. Fotografia de Brian Probyn. Edição de Chris Barnes. Música de John Cacavas. Maquiagem de George Blackler. Efeitos Especiais de Les Bowie. Elenco: Christopher Lee (Conde Drácula / D. D. Denham), Peter Cushing (Professor Lorrimer Van Helsing), Joanna Lumley (Jessica), Michael Coles (Inspetor Murray), William Franklyn (Peter Torrence), Freddie Jones (Professor Julian Keeley), Richard Vernon (Mathews), Patrick Barr (Lord Carradine), Barbara Lu Ying (Chin Yang), Lockwood West (General Freeborne), Richard Matthews (John Porter), Maurice O’Connell (Hanson), Valerie Van Ost (Jane), Peter Adair (Doutor), Maggie Fitzgerald / Pauline Peart / Finnuala O’Shannon / Mia Martin (garotas vampiras), John Harvey (Comissário), Marc Zuber, Paul Weston, Ian Dewar, Graham Rees (guardas da mansão). Filmado na EMI/MGM Elstree Studios, Boreham Wood, Hertfordshire, Inglaterra.
“Pelos seis mil terrores do inferno são batizados. É chamado, em nome dos monstros das profundezas. Sete senhores das trevas amaldiçoados. Sete vezes amaldiçoados de novo, para enfrentar o senhor dos homens e da bondade.”
A consagrada e cultuada produtora inglesa de filmes fantásticos “Hammer” foi a responsável pelo ressurgimento do Horror no final da década de 1950, quando trouxe novamente às telas do cinema os famosos monstros sagrados “Drácula”, “Criatura de Frankenstein”, “Múmia”, “Fantasma da Ópera”, “Lobisomem”, entre outros, os quais haviam sido largamente filmados em preto e branco pela saudosa produtora americana “Universal”, com Boris Karloff, Bela Lugosi e Lon Chaney Jr. Porém, dessa vez com fotografia colorida, foi produzida uma infinidade de clássicos como “A Maldição de Frankenstein” (1957) e “O Vampiro da Noite” (1958), lançando atores que se transformaram em ícones absolutos do gênero como Christopher Lee e Peter Cushing.
O ápice de sucesso da “Hammer” foi durante os nostálgicos anos 60, sendo que de uma forma inevitável suas produções acabaram se desgastando com o passar dos anos, com poucas novidades e uso exagerado de fórmulas repetitivas e clichês exaustivamente explorados, perdendo o interesse do público e culminando com uma safra de filmes de menor expressão a partir do início de 1970 até meados dessa década, com o fim das atividades da produtora. Para tentar recuperar o prestígio perdido, a “Hammer” procurou alterar a tradicional ambientação gótica de seus filmes de vampiros transportando as ações para um tempo mais moderno, atualizado com a época da produção, trocando os imponentes castelos, as pequenas e isoladas aldeias e as carruagens pelos enormes prédios e automóveis da tumultuada vida urbana da Inglaterra dos anos 70.
O primeiro exemplo dessa mudança de estilo ocorreu em 1972 com o filme de título estranho “Drácula no Mundo da Mini Saia” (Dracula AD 1972), seguido logo após por “Os Ritos Satânicos de Drácula”, dirigido por Alan Gibson, misturando elementos de vampirismo com rituais satânicos, um tema em moda e muito bem explorado na época com o clássico “O Exorcista” (1973) e outros filmes similares abordando histórias de demônios e ocultismo como “Balada Para Satã” (1971), “O Feiticeiro” (1972) e “O Anticristo”, produção italiana de 1974.
Novamente com a dupla Christopher Lee e Peter Cushing, respectivamente como o vampiro “Drácula” e o seu histórico inimigo, o antropólogo Prof. Van Helsing, “Os Ritos Satânicos de Drácula” é o oitavo filme com o personagem de uma longa série iniciada com “O Vampiro da Noite”, e com Lee interpretando pela última vez para a “Hammer” o papel do “príncipe das trevas” que o consagrou para sempre, transformando-o no principal vampiro da história do cinema, juntamente com o lendário Bela Lugosi.
Dessa vez, a história traz o malevolente vampiro “Drácula”, reencarnado na figura de um empresário milionário chamado D. D. Denham (Christopher Lee), envolvido numa conspiração satânica para tomar o poder no mundo. Um agente do serviço secreto britânico, Hanson (Maurice O’Connell), está investigando as ações misteriosas de uma seita demoníaca liderada pela sacerdotisa vampira Chin Yang (Barbara Lu Ying), que realiza rituais de satanismo na imensa mansão “Pelham House” nos arredores de Londres, um local de reuniões de um suposto grupo de pesquisas paranormais. Porém, ele é capturado e brutalmente espancado e torturado, por descobrir que os responsáveis pelos ritos de magia negra são poderosos cidadãos da sociedade inglesa. Uma vez conseguindo escapar ele passa as informações da investigação para seus superiores, o Inspetor Murray (Michael Coles) e Peter Torrence (William Franklyn), que solicitam auxílio ao antropólogo Prof. Van Helsing (Peter Cushing), renomado cientista especialista em ocultismo e vampirismo, cuja missão histórica de sua família sempre foi a de caçar vampiros.
Eles descobrem uma trama diabólica envolvendo um grupo seleto de importantes homens formado por um militar, General Freeborne (Lockwood West), um empresário latifundiário, Lord Carradine (Patrick Barr), um ministro do serviço de segurança, John Porter (Richard Matthews), e um cientista, Prof. Julian Keeley (Freddie Jones), todos manipulados pelo empresário D. D. Denham, o próprio Drácula, para espalharem um vírus letal na humanidade e lançar o mundo num caos de destruição. Eles seriam os novos “Quatro Cavaleiros do Apocalipse”, os emissários da peste negra que trariam a morte para a civilização humana.
Após o sequestro de sua bela sobrinha Jessica (Joanna Lumley), pelos capangas de Drácula, um grupo de motoqueiros rebeldes típicos dos anos 70, com o objetivo de utilizá-la num ritual satânico de sacrifício, o Prof. Van Helsing é obrigado a interferir e juntamente com o Inspetor Murray tentar o resgate da moça, sendo inevitável um confronto final com o histórico inimigo vampiro.
“Os Ritos Satânicos de Drácula” está bem longe dos melhores da série de filmes de vampiros da “Hammer”, tendo como principal referência o insuperável “O Vampiro da Noite”. A intenção de alterar a ambientação para tempos mais modernos foi sem dúvida uma estratégia comercial viável da produtora em decadência, mas ainda acho preferível os tradicionais elementos góticos presentes nos filmes anteriores, como os fascinantes castelos em ruínas à beira de penhascos, as árvores fantasmagóricas, os cemitérios macabros, a assustadora névoa espessa da floresta, os pequenos vilarejos com seus aldeões supersticiosos, e tudo aquilo que representa historicamente um horror sobrenatural à espreita, escondido nas sombras e pronto para atacar inesperadamente. A idéia de inserir rituais satânicos num mundo moderno também é muito boa, mas funcionaria melhor se não tivesse relação com o tradicional vampiro Drácula, na forma como foi idealizado pelo escritor Bram Stoker em sua obra homônima de 1897.
Porém, a despeito desses pequenos inconvenientes, o filme garante ótimos momentos de entretenimento destacando algumas sequências interessantes como o momento onde Jessica é atacada por um grupo de jovens e belas vampiras escravas de Drácula, que estavam aprisionadas em seus caixões numa cripta próxima à mansão onde eram realizadas as missas negras; a forte cena de agonia de um dos discípulos do “mestre das trevas” quando foi infectado pelo vírus que causa o lento apodrecimento de seus músculos, queimando sua pele em um terrível tormento, mergulhando na imensa dor de feridas pútridas; e o esperado desfecho com o confronto final entre Drácula e Van Helsing (o último duelo entre Christopher Lee e Peter Cushing em filmes de vampiros pela “Hammer”, após 15 anos).
Em contrapartida, três falhas em “Os Ritos Satânicos de Drácula” são bem notáveis. Uma é quando o Prof. Van Helsing está preparando uma bala de prata para seu inimigo vampiro, e logo após fundir o projétil num molde ele pega-o com as mãos para carregar seu revólver, ignorando o fato que a alta temperatura do mesmo fatalmente queimaria seus dedos. Outra situação forçada demais ocorre na cena quando Van Helsing reconhece a real identidade do empresário D. D. Denham, numa série de diálogos e atitudes inverossímeis, onde fica claro que o roteirista não se preocupou em desenvolver uma sequência mais inteligente e criativa. E por fim, faltou uma lógica para a atitude de Drácula em querer espalhar um vírus devastador na humanidade, pois dessa forma ele dizimaria todo o planeta eliminando a sua própria fonte de alimento que é o sangue de suas vítimas, parecendo que foi um ato de auto destruição por estar cansado da maldição de viver eternamente em seus incontáveis ciclos de morte e renascimento. Drácula é um ser poderoso e imponente e o roteirista foi infeliz em evidenciar sua covarde intenção de acabar com tudo, inclusive ele próprio.
Mas o roteiro de Don Houghton também está repleto de ótimos momentos de puro horror, exaltando a supremacia do Mal absoluto e dando ênfase à decadência total da humanidade, envolvida na paranóia de sua própria irracionalidade. Como por exemplo nas antológicas palavras depressivas do atormentado Professor Keeley, especialista em doenças do sangue, ao seu amigo de ciências, o antropólogo Van Helsing, tentando justificar sua atitude de desenvolver e aperfeiçoar um vírus letal similar à peste bubônica ou “morte negra” que arrasou a humanidade no passado, e que seria utilizado para contaminar o mundo e espalhar a morte no planeta:
“O mal comanda. É verdade. O mal e a violência são as únicas medidas poderosas. Olhe para o mundo, um caos. É um padrão pré-ordenado. Violência, ganância, intolerância, aversão, culpa. Os pecados mortais. Ou virtudes mortais. O ser supremo é o Diabo. Obedeça-o e ganhará a imortalidade. Ele acaba com a morte, o inimigo comum. Nada é suficientemente vil, nada é tão repulsivo, tão horrível. Você precisa conhecer o terror, o horror. Precisa sentir a maravilha da repugnância, a beleza da obscenidade.”
Ou ainda na mórbida definição descrita pelo cientista Van Helsing, ao se referir ao temível Conde Drácula:
“A força real é mais sinistra, mais obscena do que qualquer monstruosidade que imaginam. Lorde da Corrupção. Mestre dos Mortos-Vivos. O Conde Drácula.”
Christopher Lee aparece apenas em poucas cenas, mas ainda assim sua presença é marcante encarnando o imortal e amaldiçoado vampiro “Drácula”. Ele, que em seus 80 anos de idade e mais de 300 filmes no currículo, ainda está na ativa e participando como vilão de duas das mais expressivas franquias do cinema de entretenimento do momento, “Star Wars”, como o Conde Dookan, e “O Senhor dos Anéis”, interpretando o mago Saruman.
O ator inglês Peter Cushing faleceu em 1994 aos 81 anos de idade após participar de quase 100 filmes, e em sua vasta carreira no cinema as performances mais notáveis foram no gênero fantástico, onde acabou recebendo dos críticos e fãs o nobre título de “O Cavalheiro do Horror”, devido a sua natural postura aristocrática. Um de seus papéis mais significativos foi justamente como o famoso caçador de vampiros “Prof. Van Helsing”, personagem que encarnou inúmeras vezes, e que acabou associando-se a sua imagem.
“Os Ritos Satânicos de Drácula” recebeu o título original de “The Satanic Rites of Dracula” para lançamento nos Estados Unidos, sendo que na Inglaterra seu nome foi “Count Dracula and His Vampire Bride”. E, sem dúvida nenhuma, o nome americano é bem melhor e mais coerente com a história do filme, que mescla basicamente vampirismo com satanismo.
Como curiosidade, vale confirmar os tradicionais meios descritos no filme para se matar um vampiro, os quais já são bem conhecidos pelos fãs: símbolos do Bem combatem a força do Mal, como a cruz, e a palavra de Deus escrita na bíblia, a água pura e corrente que simboliza pureza, uma bala de prata, uma estaca de madeira no coração, a luz do dia, e os espinhos dos arbustos.
A data escolhida por Drácula para disseminar o vírus da peste negra na humanidade foi um especial dia 23, na comemoração do sabá dos mortos-vivos. Segundo o filme, existem círculos satânicos que governam nossa fé e regem o universo. Através da história da humanidade, existiram certas datas onde houveram grandes catástrofes, e uma vez estudadas por especialistas chegou-se à conclusão que existe um padrão definido descrevendo que os grandes desastres sofridos pela raça humana ocorreram nos períodos onde os círculos satânicos se cruzavam. No século XX houveram duas guerras mundiais e o dia 23 do mês sabático é a satânica celebração da blasfêmia suprema, o sabá dos mortos-vivos, a data ideal para o apocalipse.
“Grandes demônios do inferno. Olhai por seus discípulos. Dê-lhes poder sobre a humanidade. Nós que nos dedicamos a servi-lo e obedecê-lo. Com esse batismo de sangue seguiremos os passos eternos dos amaldiçoados para conhecer os segredos dos que atravessaram a fronteira do desconhecido até as margens do ódio.”
“Os Ritos Satânicos de Drácula” (The Satanic Rites of Dracula, 1973) – avaliação: 7 (de 0 a 10)
site: www.bocadoinferno.com / blog: www.juvenatrix.blogspot.com (postado em 10/12/05)
Os Ritos Satânicos de Drácula (The Satanic Rites of Dracula / Count Dracula and His Vampire Bride, Inglaterra, 1973). Hammer. Duração: 88 minutos. Lançado no mercado brasileiro de vídeo DVD pela Revista Dark Side (Editora MultiMedia Group). Direção de Alan Gibson. Roteiro de Don Houghton, baseado em personagem criado por Bram Stoker. Produção de Roy Skeggs. Fotografia de Brian Probyn. Edição de Chris Barnes. Música de John Cacavas. Maquiagem de George Blackler. Efeitos Especiais de Les Bowie. Elenco: Christopher Lee (Conde Drácula / D. D. Denham), Peter Cushing (Professor Lorrimer Van Helsing), Joanna Lumley (Jessica), Michael Coles (Inspetor Murray), William Franklyn (Peter Torrence), Freddie Jones (Professor Julian Keeley), Richard Vernon (Mathews), Patrick Barr (Lord Carradine), Barbara Lu Ying (Chin Yang), Lockwood West (General Freeborne), Richard Matthews (John Porter), Maurice O’Connell (Hanson), Valerie Van Ost (Jane), Peter Adair (Doutor), Maggie Fitzgerald / Pauline Peart / Finnuala O’Shannon / Mia Martin (garotas vampiras), John Harvey (Comissário), Marc Zuber, Paul Weston, Ian Dewar, Graham Rees (guardas da mansão). Filmado na EMI/MGM Elstree Studios, Boreham Wood, Hertfordshire, Inglaterra.
“Pelos seis mil terrores do inferno são batizados. É chamado, em nome dos monstros das profundezas. Sete senhores das trevas amaldiçoados. Sete vezes amaldiçoados de novo, para enfrentar o senhor dos homens e da bondade.”