“Promessa de Conservação: Eu prometo, como americano,
preservar e lealmente defender contra devastação, os recursos naturais do meu
país, o seu solo e seus minerais, suas florestas, suas águas e vida selvagem.”
Esse texto de
comprometimento, válido não somente para os americanos e seu país, os Estados
Unidos, mas para toda a humanidade e nações da Terra, é a premissa básica para
o argumento ecológico de um dos mais belos filmes de ficção científica da
história do gênero. Trata-se de “Corrida Silenciosa”
(Silent Running), produzido em 1972, estrelado por Bruce Dern e dirigido por
Douglas Trumbull, mais conhecido não como cineasta e sim por sua atuação na
área dos efeitos especiais como no clássico de Stanley Kubrick “2001: Uma Odisséia
no Espaço” (1968), que aliás ganhou um “Prêmio Oscar” nessa categoria.
(Atenção: o texto a seguir
contém spoilers)
Num futuro não
determinado, a natureza não existe mais na Terra, as florestas, plantações de
frutas e verduras e a vida animal fazem agora parte de um passado morto pela
ação destrutiva da humanidade. As últimas espécies de vegetação natural,
árvores, hortas e alguns animais como coelhos, esquilos, pássaros, tartarugas e
lagartos são mantidos vivos em enormes domos transportados pelo espaço por uma
imensa nave cargueira chamada “Valley Forge”, administradas pelo astronauta
botânico Freeman Lowell (Bruce Dern). Trabalhando sob a “Promessa de
Conservação” citada no início, ele e mais três astronautas, Wolf, Barker e
Keenan (interpretados por Cliff Potts, Ron Rifkin e Jesse Vint), viajam pelo
espaço infinito levando as florestas em gigantescos domos, mantendo viva pelo
menos no espaço a natureza de nosso planeta decadente (cuja temperatura passou
a ser de 24 graus Célsius constante), apesar que apenas em seus recursos
naturais, pois a evolução e modernidade da civilização conseguiu quase
extinguir as doenças e desemprego, porém num mundo agora artificial.
Lowell é o
responsável há mais de oito anos por um projeto de manutenção das florestas no
espaço com o objetivo de um dia poder novamente plantá-las na Terra e poder
garantir para as futuras gerações o prazer de desfrutar da natureza, algo
inexistente para a humanidade atual, que sobrevive com alimentos artificiais.
Porém, ele recebe uma ordem de um comando superior para, sem explicação alguma
(nisso o roteiro apresenta uma falha), destruir os domos com as florestas
através de detonadores nucleares, e retornar para a Terra com o cargueiro em
condições de ser utilizado agora comercialmente. Uma vez não aceitando abortar
sua missão e destruir as últimas florestas existentes, após a explosão nuclear
de alguns domos Lowell se rebela tomado por um súbito momento de insanidade e
mata um de seus companheiros com um golpe de pá, o qual queria explodir a
floresta onde ele se encontrava. Imediatamente depois ele prende os outros dois
astronautas em outro domo enquanto era preparada sua destruição e aciona o
lançamento da enorme cápsula florestal vindo também a explodir no espaço junto
com os homens.
Após matar os
outros tripulantes, que estavam acatando ordens superiores e não concordavam
com sua opinião de manter vivas as florestas, Lowell sequestra e tenta assumir
o controle do cargueiro que desorientado vai em direção aos anéis gasosos de
Saturno. Uma vez ferido na perna direita no confronto com um dos astronautas,
ele recruta três pequenos robôs de manutenção da “Valley Forge”, os drones números
1, 2 e 3, e alterando suas programações, ele utilizou as máquinas para
realizarem uma operação em sua perna que teve sucesso.
A partir desse
momento, ele batiza os robôs com os nomes originais dos sobrinhos do Pato
Donald, o número 1 é Dewey e o número 2 é Huey, sendo que o terceiro, Louie
havia sido tragado por uma tempestade cósmica quando realizava um serviço de
manutenção na nave. As máquinas passaram a ser seus companheiros de viagem numa
jornada sem rumo objetivando apenas manter vivas as florestas restantes. Porém,
a vegetação começou a morrer gradativamente para o desespero de Lowell que
tentava sem êxito a sua recuperação, enquanto uma nave de resgate chamada
“Berkshire”, desconhecendo o que realmente aconteceu no cargueiro espacial,
procurava o paradeiro da “Valley Forge”. A apenas algumas horas antes do
contato final entre as naves, o botânico Lowell descobriu o real motivo da
decadência das árvores e animais do domo que consistia na falta do Sol, pois
eles estavam muito distantes do astro rei. A solução foi a implantação de
várias luzes artificiais que substituiriam a luz solar e as florestas então se
recuperaram.
Porém, antes
do contato de resgate da “Berkshire”, Lowell já muito cansado e sem forças para
continuar, despacha o drone Dewey, treinado para a manutenção da vegetação, no
único e último domo florestal, que se solta do cargueiro sem rumo pelo espaço
infinito, enquanto ele juntamente com o outro drone Huey, que estava avariado
devido a um acidente, aciona o mecanismo nuclear de autodestruição da “Valley
Forge”, culminando num último e fatal clarão na escuridão do espaço.
Um
porta-aviões desativado após missões em guerras foi modificado para servir como
cenário do interior do cargueiro espacial, que por sua vez também foi
reaproveitado e apareceu na série de TV “Galactica – Astronave de Combate”
(1978 / 1979), como uma nave agrícola da frota de refugiados.
Os robôs anões
Dewey e Huey podem ser considerados um grande destaque do filme, além da
magnífica interpretação de Bruce Dern como o botânico Freeman Lowell. Os drones
parecem humanos e são super carismáticos, apesar de não falarem, andando vagarosamente
com suas pequenas pernas mecânicas. Curiosamente, vários robôs similares foram
vistos posteriormente em “Guerra nas Estrelas”, 1977, de George Lucas,
incluindo o popular “R2-D2”).
Já Dern está
excepcional, no difícil papel de um cientista perturbado pela ideia de
destruição de seus sonhos, as últimas florestas terráqueas vivas. É bem
compreensível sua atitude num momento de loucura, matando seus companheiros em
função de um objetivo maior com a manutenção do que restou da natureza, sem
pensar muito nas consequências fatais desses atos.
Uma cena muito
engraçada envolvendo os pequenos robôs é quando eles estão jogando baralho com
Lowell, que os ensina o jogo através de novas programações, e que após algumas
rodadas é surpreendido pelos Drones que trapaceiam e o vencem. Outro momento de
humor é quando Lowell está ensinando os robôs a plantarem uma árvore e eles de
forma desajeitada fazem um péssimo serviço na primeira tentativa, mostrando que
suas habilidades são melhores mesmo para os serviços de manutenção da nave.
Os efeitos
especiais são belíssimos com as reproduções de miniaturas detalhadas do
cargueiro espacial e seus domos florestais, além dos cenários internos da nave,
com suas portas, painéis de controle e pontes de comando. A trilha sonora é um
capítulo à parte, com uma música magistral a cargo de Peter Schickele e as
canções “Silent Running” e “Rejoice in the Sun” com letras de Diane Lampert e
interpretadas por Joan Baez, transmitindo momentos memoráveis principalmente
nas sequências finais com o domo remanescente em sua jornada solitária pelo
espaço infinito.
Lançado no
Brasil em DVD pela “Universal”, “Corrida Silenciosa” é um inesquecível filme
ecológico de ficção científica, produzido há muitos anos atrás e já
demonstrando a preocupação na manutenção das reservas naturais de nosso
planeta, passando uma mensagem de paz para a humanidade e reconhecimento da
importância fundamental da natureza em nossas vidas, servindo de alerta para
uma evolução coordenada de nossa civilização.
“Tivemos uma época em que havia flores
por toda a Terra... e havia vales. E havia planícies de grama alta e verde onde
você poderia deitar - você poderia dormir. E havia céus azuis, e havia ar
fresco... e havia coisas crescendo em todos os lugares...” – Freeman Lowell
Corrida Silenciosa (Silent Running, EUA, 1972). Universal. Duração: 84 minutos. Direção:
Douglas Trumbull. Roteiro: Deric Washburn, Mike Cimino e Steve Bochco. Produção: Michael Gruskoff. Fotografia:
Charles F. Wheeler. Edição: Aaron Stell. Efeitos Especiais de Fotografia:
Douglas Trumbull e John Dykstra. Efeitos Especiais: Richard O. Helmer, James
Rugg, Marlin Jones, Vernon Archer e R. I. Hilmer. Música composta e conduzida
por Peter Schickele, com canções de Joan Baez. Elenco: Bruce Dern, Cliff Potts,
Ron Rifkin, Jesse Vint.
(RR – Escrito originalmente em 08/2002 e
revisado em 01/2024)