Lembrando com
bastante similaridade o horror cru e brutal de filmes clássicos dos anos 1970
como principalmente “O Massacre da Serra Elétrica” (73), de Tobe Hooper e
“Quadrilha de Sádicos” (77), de Wes Craven, entre outros, “Pânico na Floresta” (Wrong Turn), que entrou em cartaz nos cinemas
brasileiros em 05/03/04, procura resgatar aquele clima perturbador
característico do cinema de horror desse período, com uma história simples,
porém intensa de violência. Um grupo de jovens desvia o seu caminho numa
estrada no meio da floresta e encontra uma cabana isolada, habitada por
canibais defeituosos que uma vez famintos por suas carnes, passam a
perseguí-los sem piedade.
O
filme começa mostrando um jovem casal de alpinistas, Rich (David Huband) e
Halley (Yvonne Gaudry), escalando uma parede de pedra na região montanhosa de
West Virginia, quando são surpreendidos por algo oculto e ameaçador na floresta
ao redor.
A
ação volta-se então para o estudante de medicina Chris Flynn (Desmond
Harrington), que está viajando de carro para uma cidade onde faria uma
entrevista de emprego com hora marcada. Porém, um acidente na estrada atrapalha
seus planos e ele decide ir até um obscuro posto de gasolina numa estrada
secundária à procura de um telefone. Lá chegando, Chris é mal recepcionado por
um homem velho e sujo (Wayne Robson) e encontra um mapa onde aparece uma rota
alternativa para que ele pudesse chegar ao seu destino. O jovem estudante não
sabia que sua decisão o levaria na direção errada (ou “Wrong Turn” do
original), com consequências desastrosas.
Enquanto
isso, um grupo de jovens em passeio pára forçosamente o carro numa estrada
remota que corta uma floresta densa, devido aos pneus furados por um arame
farpado colocado misteriosamente no meio do caminho. O grupo é formado por
Jessie Burlingame (Eliza Dushku) e dois casais de namorados, Evan (Kevin
Zegers) e Francine (Lindy Booth), e Scott (Jeremy Sisto, de May – Obsessão
Assassina) e Carly (Emmanuelle Chriqui). Ao pegar a mesma estrada de terra,
Chris provoca um acidente num momento de distração e se choca na traseira do
veículo dos jovens, que estava parado em local perigoso.
Depois de
acalmado um pouco o tumulto criado, o grupo decide se dividir, e enquanto o
casal Evan e Francine fica no carro, Jessie, Chris e o casal Scott e Carly,
decidem caminhar pela estrada à procura de ajuda. No caminho, eles encontram
uma cabana misteriosa isolada no meio do mato, repleta de armas de caça e
restos de carne para todos os lados, revelando-se ser na verdade a moradia de
uma família de canibais deformados através de relações incestuosas. Eles são
conhecidos pelos bizarros nomes de “Three Finger” (ou Três Dedos, interpretado
por Julian Richings), “Saw-Tooth” (ou Dente de Serra, feito por Garry Robbins),
e “One-Eye” (ou Um Olho, papel de Ted Clark). A partir daí, inicia uma corrida
desesperada dos jovens por suas vidas, fugindo da fúria implacável das
criaturas disformes que querem aumentar seu estoque de carne humana nas
geladeiras.
“Pânico
na Floresta” apresenta uma série de furos no roteiro, clichês e situações
inverossímeis que inevitavelmente não puderam passar despercebidas. A maior
incoerência é o fato dos canibais atuarem na região impunemente há muito tempo
(percebe-se isso pelos inúmeros carros abandonados numa clareira próxima à
cabana, e que pertenceram às vítimas que invadiram suas terras), e não
despertarem a atenção da polícia para uma investigação mais detalhada. Não
faltaram os diálogos idiotas entre os jovens namorados, numa despreocupação
total do roteirista em desenvolver os personagens, condenando-lhes apenas a
serem vítimas descartáveis da fúria dos canibais. Aliás, as conversas banais e
óbvias sobre drogas e sexo somente nos incitam a torcer para que os autores das
frases inúteis morram logo e dolorosamente. Além dos manjados sustos fáceis, em
cenas exageradas que não impressionam de forma alguma o público mais experiente
com filmes de horror.
Uma sequência
em especial que exemplifica bem a falta de cuidado em tornar os eventos da
história mais reais, é quando um grupo de três jovens, isolados no alto de uma
torre de vigia no meio da floresta à noite, é obrigado a abandonar o local às
pressas por causa de um incêndio provocado pelos canibais perseguidores. Eles
então se atiram em direção às copas das árvores sem se ferirem, quando
normalmente o choque de seus corpos em queda livre contra galhos pontudos
significaria no mínimo algumas escoriações profundas ou ossos quebrados. Os
atores são bem inexpressivos, não conseguindo convencer como fugitivos perdidos
no meio de uma enorme floresta, sendo caçados brutalmente por assassinos que
querem rasgar seus corpos e comer suas carnes. Uma das protagonistas
principais, a atriz Eliza Dushku, por exemplo, tem apenas a beleza ao seu
favor, porque suas qualidades de interpretação são bem limitadas, assim como o
restante do elenco.
Porém,
o filme tem também os seus bons momentos, que devem ser enaltecidos por
tratar-se de uma produção independente com um orçamento de apenas US$ 10
milhões, uma quantia pequena em comparação com a maioria dos outros filmes
similares. Os destaques ficam por conta dos abomináveis canibais deformados,
que agem com uma insanidade perturbadora e se comunicam por grunhidos guturais,
sendo os responsáveis por mortes violentas com direito a machadadas, ferimentos
por arremesso de flechas, e sangue para todos os lados. Além da cuidadosa
fotografia de belas florestas, montanhas, cachoeiras e precipícios (em locações
em parques florestais de Toronto, no Canadá), evidenciando um contraste enorme
com a violência grotesca dos canibais caçando os turistas de passagem pelo
local.
Apesar
do argumento básico muito comum e já explorado diversas outras vezes, a ideia
de uma cabana no meio da floresta, abrigando criaturas disformes e famintas por
carne humana, perseguindo e mutilando cruelmente quem aparecesse em seus
domínios, sempre despertará uma atenção e interesse especial no espectador. Uma
vez imaginando-se numa situação parecida, sendo vítima da violência furiosa de
canibais, fugindo desesperadamente por sua vida.
“Pânico na
Floresta” teve também um desfecho interessante, quando apresenta primeiro um
final óbvio e comum, daqueles totalmente previsíveis e esperados, seguido de
alguns letreiros de créditos, para logo depois mostrar um final definitivo e
bem mais trágico e violento, abrindo a possibilidade de uma sequência, e
concluindo de forma mais perturbadora, numa tentativa de surpresa.
O
nome nacional do filme novamente foi mal escolhido, sendo completamente
diferente do original “Wrong Turn”, que significaria algo como “Caminho Errado”
ou “Na Direção Errada”. O título original refere-se claramente ao argumento
básico do filme, ou seja, um grupo de jovens que ao desviarem seu caminho
pegando um atalho numa floresta, acabaram indo de encontro a uma família feroz
e violenta de canibais assassinos e deformados. O nome “Pânico na Floresta” é
banal, simples e comum demais. Temos inclusive outro filme francês de horror
adolescente chamado “Deep in the Woods” (2000), que foi lançado por aqui em
vídeo pela “Europa Filmes” e que teve o mesmo nome de “Pânico na Floresta”,
contribuindo ainda mais para complicar a catalogação das produções que chegam ao
nosso país pelos fãs e colecionadores. A forma de nomear os filmes no Brasil
deveria ser encarada com mais cuidado e profissionalismo, para evitar confusões
e interpretações erradas. É incrível como a ideia de um suposto sucesso
comercial de um filme de horror no Brasil tenha que passar por um nome contendo
palavras relacionadas ao gênero como por exemplo “maldição” ou “pânico”. Nesse
último caso, só para exemplificar, temos a franquia “Pânico” (Scream, 1996 / 1998
/ 2000 / 2011), “Pânico em
Alto Mar ” (Adrift, 92), “Pânico em Lovers Lane ” (Lovers
Lane, 99), “Pânico em Munique” (21 Hours at Munich, 76), “Pânico na Estrada”
(Road Rage, 99), “Pânico no Lago” (Lake Placid, 99), “Pânico Virtual” (The
Mangler 2, 99), entre muitos outros.
Curiosamente,
o filme “Amargo Pesadelo” (Deliverance, 72), de John Boorman e com Jon Voight e
Burt Reynolds, é citado nominalmente numa cena por um dos jovens candidatos a
virar refeição dos canibais desfigurados.
Sobre
o elenco, Desmond Harrington já trabalhou em outros filmes de horror como o
intrigante “O Buraco” (2001), “Navio Fantasma” (2002), “Olhos da Morte” (2003),
“Terror na Estrada” (2008) e a série “Dexter”, e a bela atriz morena Eliza
Dushku participou em muitos episódios da série de TV “Buffy – A Caça Vampiros”
(Buffy – The Vampire Slayer, 1997/2003), do fraquíssimo thriller sobrenatural “Alucinação”
(Soul Survivors, 2001), “O Assassino do Alfabeto” (2008) e “A Maldição da
Libélula” (2009).
Na equipe
técnica de produção, destaca-se a presença de Stan Winston como produtor.
Americano nascido em 1946 no Estado da Virginia, Winston foi condecorado quatro
vezes com o cobiçado “Prêmio Oscar”, e já tem seu nome associado ao cinema
fantástico através de seus trabalhos consagrados em filmes como “O Enigma do
Outro Mundo”, a franquia “O Exterminador do Futuro”, “Edward Mãos de Tesoura”, “Entrevista
Com o Vampiro”, “A Ilha do Dr. Moreau” (versão de 1996), “A. I. – Inteligência
Artificial” e “Constantine”. Ele faleceu em 2008 aos 62 anos.
Notas do Autor (11/08/10 + 26/10/14): “Pânico na Floresta”
inevitavelmente gerou uma franquia enorme por causa de seu tema popular e
comercial (“o ataque de canibais deformados”), com a produção de vários filmes seguintes,
predominando em todos eles uma qualidade bastante duvidosa nos roteiros, se
contrapondo à violência exagerada e sangue em profusão. Em 2007 foi
lançado “Wrong Turn 2: Dead End”, que recebeu no Brasil o nome de “Floresta do
Mal” (para confundir ainda mais quem se dedica à pesquisa e catalogação dos
filmes de horror lançados por aqui), e em 2009 foi lançado “Wrong Turn 3: Left
for Dead” (“Floresta do Mal: Caminho da Morte”). Em seguida, tivemos mais três
filmes: “Pânico na Floresta 4”
(Wrong Turn: Bloody Beginnings, 2011), “Pânico na Floresta 5” (Wrong Turn 5: Bloodlines,
2012), com a presença de Doug Bradley no elenco (o eterno líder cenobita
“Pinhaed” da franquia “Hellraiser”), e “Pânico na Floresta 6” (Wrong Turn 6: Last Resort,
2014).
“Pânico na Floresta” (Wrong Turn, 2003) – artigo # 221 – data:
08/02/04 – avaliação: 7 (de 0 a
10)
site: www.bocadoinferno.com / blog: www.juvenatrix.blogspot.com
(postado em 21/02/06)