O Olho Que Tudo Vê (2002)


Você não vê o medo. Você sente

Abordando a moda atual dos “reality shows”, no estilo do popular programa de TV “Big Brother”, utilizando como cenário uma enorme casa com estilo gótico isolada numa floresta, e com o auxílio da moderna tecnologia através da transmissão ininterrupta pela internet, a rede mundial de computadores, obtemos como resultado o thriller com elementos de horror “O Olho Que Tudo Vê” (My Little Eye), dirigido pelo galês Marc Evans e que estreou nos cinemas brasileiros em 30/05/03, explorando essa mistura de idéias de forma perturbadora.

Um grupo de cinco jovens é escolhido para participar de um “reality show” transmitido pela internet. Os eleitos são típicos estereótipos representados através de três homens, o galã Matt (Sean Cw Johnson), o rejeitado Danny (Stephen O’Reilly) e o “doidão” Rex (Kris Lemche), e de duas mulheres, a exibicionista Charlie (Jennifer Sky), e a “certinha” Emma (Laura Regan). Com motivações variadas, desde a obtenção de sucesso, fama, dinheiro e até por simples curiosidade, eles precisam passar seis meses confinados numa mansão com estilo gótico, localizada no meio de uma floresta, sendo filmados por diversas câmeras espalhadas por todos os cômodos. Ao contrário dos tradicionais jogos similares da televisão, os participantes não são eliminados com o passar do tempo, não há aquelas “festinhas” ridículas e nem precisam realizar provas para ganhar comida ou outros objetos. Eles precisam permanecer todos juntos até o final do programa, sem nenhuma desistência, para serem recompensados cada um com a quantia significativa de um milhão de dólares. Se qualquer um deles sair por desistência, todos perdem juntos, tornando o objetivo final ainda mais difícil de ser conquistado.
Esse argumento básico já foi utilizado de forma similar e com algumas variações no filme “A Casa da Colina” (House on Haunted Hill, 1999), de William Malone, onde nesse caso cinco pessoas são convidadas a passar uma noite numa mansão assombrada e quem sobrevivesse ganharia um milhão de dólares. Por sua vez, “A Casa da Colina” é uma refilmagem de uma produção “B” de 1958, “A Casa dos Maus Espíritos”, dirigida por William Castle e estrelada pelo lendário Vincent Price.

“O Olho Que Tudo Vê” começa mostrando cenas da fase de seleção dos participantes, com curtos depoimentos dos escolhidos. Depois passa rapidamente para o confinamento na casa, já próximo do final dos seis meses, na última semana do programa. Nesse momento os personagens são melhor apresentados e ocorrem alguns inevitáveis sinais de desgaste entre eles após tanto tempo juntos no mesmo lugar e isolados do resto do mundo, sendo vigiados constantemente por incômodas câmeras.
Porém, para tumultuar ainda mais o tenso ambiente, começam a acontecer eventos estranhos ameaçando a estabilidade emocional dos jovens, como a descoberta de uma inscrição ofensiva em uma das janelas da casa, ou o aparecimento de um martelo ensanguentado na cama de Emma, ou pior ainda, a visita inesperada de um misterioso esquiador perdido, Travis Petterson (Bradley Cooper), que alega não conhecer o jogo transmitido pela internet.
A partir daí, a história alcança seu clímax de tensão, com crescentes conflitos psicológicos entre os personagens e com a morte e o mistério envolvendo o assustado grupo de jovens, culminando com um trágico desfecho revelador.

Lembrando filmes como “A Bruxa de Blair”, pelo clima de claustrofobia e horror, e “O Show de Truman”, pela incômoda exposição pública da vida dos personagens 24 horas por dia, o roteiro básico de “O Olho Que Tudo Vê”, escrito por David Hilton e James Watkins, não tem grande originalidade, aproveitando todos os clichês usuais de filmes similares. Com um grupo vivendo numa enorme casa gótica, isolada numa floresta coberta por chuvas incessantes de neve, enfrentando o aparecimento de situações misteriosas e sendo dizimado violentamente pelas ações de um assassino, que pode ser de origem externa ou do próprio grupo. E alguns absurdos da história ficaram muito evidentes como por exemplo o fato de simplesmente ser desprezada a óbvia repercussão e influência dos familiares dos jovens confinados na macabra mansão quando começam a acontecer atividades fora da normalidade, ou ainda a notável falta de intimidade e interação entre os participantes do jogo, mesmo estando reclusos numa mansão isolada por quase seis meses.
Mas o filme tem ao seu favor a interessante idéia de acrescentar novos elementos à trama, com um suposto “jogo” no estilo “reality show”, filmado de forma ininterrupta por câmeras que transmitem as imagens por internet para espectadores sedentos por violência real, explorando com eficiência a misteriosa mitologia que envolve os chamados “snuff movies” (filmes ilegais com supostas mortes reais em cena e que já se transformaram numa espécie de “lenda urbana”).
O título escolhido para o lançamento do filme no Brasil é até adequado e coerente com a história, porém o ideal e mais apropriado ainda seria a simples tradução do original, “My Little Eye” para “Meu Pequeno Olho”. Os responsáveis pela escolha dos nomes nacionais dos filmes que chegam por aqui ainda continuam insistindo em complicar de forma equivocada essa fácil tarefa. Outro detalhe é que “O Olho Que Tudo Vê” é mais um desses filmes que demoram demais para serem lançados no Brasil, o que é um fato lamentável, sendo desnecessária essa longa espera, pois estreou na Inglaterra em 04/10/02 e somente veio para nós quase oito meses depois.
O diretor Marc Evans não é muito conhecido, e seu principal trabalho anterior foi com o thriller “A Ressurreição” (Resurrection Man, 1998), filme inglês com Stuart Townsend. Os atores também são novatos, com destaque para Kris Lemche que interpretou Rex, o personagem mais interessante da trama, um viciado em informática e fumante de maconha que fica fazendo caretas para as câmeras e dizendo claramente seus objetivos em participar do jogo, visando unicamente o dinheiro do prêmio, provocando com frases ofensivas o público que está assistindo pela internet. Ator canadense nascido em 1978, ele participou também do perturbador filme de realidade virtual “ExistenZ”, dirigido por David Cronenberg em 1999, e do filme de horror “Possuída” (Ginger Snaps, 2000), de John Fawcett.
Dos outros atores, Sean Cw Johnson pode ser visto na série de TV e nos filmes para cinema da dispensável franquia “Power Rangers”, como Carter Grayson (Red Lightspeed Ranger); Jennifer Sky participou em vários episódios da série de TV “Xena: A Princesa Guerreira” (1995/2001), como a personagem Amarice e fez uma pequena ponta na comédia “O Amor é Cego” (Shallow Hal, 2001); e Laura Regan esteve num papel secundário em “Corpo Fechado” (Unbreakable, 2000), de M. Night Shyamalan e ao lado de Bruce Willis e Samuel L. Jackson, além da comédia “Alguém Como Você” (Someone Like You, 2001) e do suspense “Habitantes da Escuridão” (2002), apresentado por Wes Craven.

“O Olho Que Tudo Vê” (My Little Eye, 2002) – avaliação: 7 (de 0 a 10)
site: www.bocadoinferno.com / blog: www.juvenatrix.blogspot.com (postado em 21/02/06)

O Olho Que Tudo Vê (My Little Eye, Inglaterra, França, Estados Unidos, 2002). Working Title. Duração: 95 minutos. Direção de Marc Evans. Roteiro de David Hilton e James Watkins. Produção de Jonathan Finn, Allan Greenspan, David Hilton e Jane Villiers. Fotografia de Hubert Taczanowski. Música de Bias. Direção de Arte de Laura MacNutt. Edição de Mags Arnold. Efeitos Especiais de Mark Ahee, Darcy Callaghan, Michael Gagnon e John LaForet. Elenco: Sean Cw Johnson (Matt), Jennifer Sky (Charlie), Kris Lemche (Rex), Stephen O’Reilly (Danny), Laura Regan (Emma), Bradley Cooper (Travis Patterson), Nick Mennell (Policial).