May - Obsessão Assassina (2002)


Se você não pode achar um amigo... faça um.

Imaginemos uma garota perturbada e traumatizada desde sua infância por um problema físico, no caso um olho defeituoso por causa de um estrabismo, no melhor estilo da perigosa e vingativa “Carrie” (do filme “Carrie, a Estranha”, 1976, de Brian De Palma e baseado em livro de Stephen King). E misturando elementos do clássico “Frankenstein”, baseado na obra da escritora Mary Shelley, adaptada para o cinema numa infinidade de versões, através da concepção macabra de uma criatura formada por partes de corpos humanos. O resultado dessa interessante mistura deu origem ao filme “May – Obsessão Assassina” (May, 2002), que poderia ter sido lançado nos cinemas brasileiros, mas preferiram comercialmente apenas colocá-lo diretamente no mercado de vídeo.

A história apresenta a estranha May Dove Canady, interpretada pela atriz Chandler Riley Hecht quando criança e por Angela Bettis quando adolescente, uma moça que nasceu com um problema em um dos olhos, obrigando-a a escondê-lo de seus amigos e recebendo de castigo uma vida excluída da sociedade “normal”. Vivendo com os pais (Kevin Gage e Merle Kennedy), sua única companhia é uma boneca de aspecto estranho chamada “Suzie”, que ganhou de sua mãe e que fica sempre dentro de um compartimento fechado de vidro, e com quem conversa constantemente. Já adolescente, e vivendo agora sozinha, porém ainda esquisita e tímida e com o estrabismo de seu olho corrigido por uma lente de contato, ela sempre teve dificuldades nos relacionamentos amorosos, como com o jovem Adam Stubbs (Jeremy Sisto, de “Pânico na Floresta”), um estudante de cinema, e com a bela, sensual e lésbica Polly (Anna Faris), colega de trabalho em seu emprego como assistente numa clínica de animais, de propriedade de um veterinário estrangeiro (Ken Davitian).
Uma vez decepcionada com suas tentativas frustradas de novas amizades, May descobre que as pessoas são cheias de falhas e somente partes delas são perfeitas. Revoltada, ela decide colocar em prática um plano maquiavélico e insano, o de criar um ser perfeito como amigo, formado através das melhores partes físicas de outras pessoas, devidamente amputadas e costuradas, já que May sempre demonstrou habilidade em costurar suas próprias roupas, além de trabalhar como assistente em operações de animais e estudar livros sobre amputação. O resultado foi a criação macabra de um ser formado pelas mãos de Adam, o pescoço de Polly, as pernas de Ambrosia (Nichole Hiltz), uma namorada de Polly, e os braços de um punk tatuado. A criatura foi batizada de Amy (Tricia Kelly), um anagrama de May, reservando um desfecho completamente perturbador e memorável.

Tudo o que eu quero...é que olhem para mim” – May, em desespero pelo sentimento de rejeição.

“May – Obsessão Assassina” é um filme de horror diferente e “estranho”. A mistura de “Carrie” com “Frankenstein” funcionou de forma interessante, onde somos apresentados vagarosamente ao drama pessoal de May, uma garota alienada desde a infância e que devido às frustrações amorosas decide montar uma criatura com os melhores pedaços de seus amigos. A história é pausada, contada num ritmo lento de pouca ação, e as cenas de morte, sangue e violência gráfica são apenas discretas. Angela Bettis está muito bem fazendo o papel de uma jovem estranha e desajustada, demonstrando um grau de insanidade crescente capaz de levá-la a cometer assassinatos, conseguindo manter a atenção do espectador ao seu drama particular. E o final, com um sutil toque sobrenatural, é digno de se manter na lembrança como uma mistura diferenciada de violência e compaixão. Assim como as pessoas que se aproximaram de May afirmaram que se sentiam atraídas pelo jeito “estranho” da moça, o filme também exerce um fascínio e atração no espectador justamente por suas características “estranhas”.
Como curiosidades, o diretor italiano Dario Argento é homenageado através da citação de seu filme “Trauma” (93), quando o aspirante a cineasta Adam diz para May que iria ver o filme numa tarde de folga, e também pelo poster de “Terror na Ópera” (87) pendurado no quarto dele. Aliás, Adam demonstra ser apreciador do cinema de horror e escatologia quando mostra para May seu mórbido curta metragem independente chamado “Jake and Jill”. O filme, fotografado em preto e branco, mostra um casal de namorados que estão inicialmente trocando carícias numa praça, e cuja relação se transforma em violentos atos de canibalismo entre eles, com direito a mordidas e carne dilacerada com sangue para todos os lados. Esse pequeno filme foi na verdade interpretado por Jesse Hlubik (Jake) e Jennifer Grant (Jill), e dirigido por Chris Silvertson, com os efeitos especiais criados por Zach Passero.
Algumas cenas de destaque são os assassinatos de Polly, com cortes precisos de navalha em seu pescoço, e de Ambrosia, que estava segurando um pacote de leite quando foi golpeada por May, com seu sangue se misturando ao leite no chão, num efeito bizarro de combinação entre o fluído vital vermelho e o branco do líquido que serve de importante alimento.
“May – Obsessão Assassina” foi lançado no mercado de vídeo nacional em 10/02/04, pela “FlashStar”. E confirmando a mania desagradável de se acrescentar subtítulos aos filmes que chegam ao Brasil, “May” não escapou dessa regra e ganhou um desnecessário complemento de seu nome original como “Obsessão Assassina”, provavelmente para enfatizar comercialmente as características de horror do argumento. A capa da fita VHS traz alguns erros de nomes nos créditos, demonstrando uma falta de cuidado maior na revisão: os sobrenomes das atrizes Angela Bettis e Anna Faris estão escritos de forma errada na ficha técnica, como Berris e Fais respectivamente. E o trabalho das legendas se equivocou ao chamar o sobrenome da família de May como Kennedy, sendo que o correto é Canady. Uma melhor pesquisa sobre o assunto evitaria esse erro.
Curiosamente, o diretor Lucky McKee e o produtor John Veague aparecem rapidamente no filme em pequenas pontas não creditadas. Aliás, Lucky McKee está envolvido num projeto de outro filme de horror com previsão de lançamento em 2004. Trata-se de “The Woods”, que terá Bruce Campbell no elenco, o herói da série “The Evil Dead”, de Sam Raimi.
O elenco de “May – Obsessão Assassina” é jovem e pouco conhecido. A protagonista principal, Angela Bettis, que fez o papel da malévola May, nasceu em 1975 e esteve antes em “Garota Interrompida” (99), “A Filha da Luz” (2000) e no papel da psicótica Carrie White, numa longa versão para a televisão produzida em 2002 e dirigida por David Carson. Já a bela Anna Faris, nascida em 1976, é mais reconhecida pelo papel de Cindy Campbell nos três filmes da franquia “Todo Mundo em Pânico” (Scary Movie), especializada em satirizar outros filmes, principalmente de horror. Ela também participou do thriller “Pânico em Lovers Lane” (99).

Tenha cuidado... ela pode levar o seu coração.

“May – Obsessão Assassina” (May, 2002) # 223 – data: 10/02/04 – avaliação: 7 (de 0 a 10)
site: www.bocadoinferno.com / blog: www.juvenatrix.blogspot.com (postado em 13/02/06)

May – Obsessão Assassina (May, Estados Unidos, 2002). Lions Gate. Duração: 93 minutos. Direção e roteiro de Lucky McKee. Produção de Marius Balchunas, Richard Middleton e Scott Sturgeon. Produção Executiva de Eric Koskin e John Veague. Música de Jaye Barnes-Luckett. Fotografia de Steve Yedlin. Edição de Debra Goldfield, Rian Johnson e Chris Sivertson. Desenho de Produção de Leslie Keel. Elenco: Angela Bettis (May Dove Canady), Jeremy Sisto (Adam Stubbs), Anna Faris (Polly), Nichole Hiltz (Ambrosia), Kevin Gage (Sr. Canady), Merle Kennedy (Sra. Canady), Chandler Riley Hecht (Jovem May), James Duval, Rachel David, Nora Zehetner, Will Estes, Roxanne Day, Samantha Adams, Brittney Lee Harvey, Connor Matheus, Mike McKee, Ken Davitian, Bret Roberts, Tracy Burr, Jude McVay, Tricia Kelly, Norwood Cheek, Jesse Hlubik, Jennifer Grant.