Os Monstros da Noite (The Navy Vs. the Night Monsters, EUA, 1966)

“Antártica, o continente gelado na extremidade do mundo. Um continente tão misterioso e desconhecido como os outros planetas do nosso Sistema Solar, ou um mundo no espaço imenso há milhões de anos-luz. Durante incontáveis milênios, os segredos deste deserto glacial permaneceram ocultos do resto do mundo, cobertos por uma traiçoeira camada de gelo. Surgiram então os primeiros exploradores antárticos; Wilkes, Scott, Shackelton, Amundsen, Bird. Homens intrépidos, de coragem e tenacidade em busca dos segredos desse continente hostil e gelado. Logo após vieram os exploradores modernos, forças tarefa mecanizadas de cientistas e técnicos de muitas nações, trabalhando juntos na descoberta dos segredos da Antártica. Operações iniciais: O Ano Geofísico Internacional, as pesquisas científicas. E agora, após mais de um ano de explorações e estudos, um grupo desses cientistas está deixando seus acampamentos. Seu destino: os Estados Unidos da América. Sua carga: espécimes de vida animal e vegetal dos confins do mundo.”


Essa é a introdução narrada de mais um filme de ficção científica com elementos de horror da produtiva e nostálgica década de 1960. Trata-se da produção americana “Os Monstros da Noite” (The Navy Vs. The Night Monsters, 1966, que numa tradução literal seria “A Marinha Contra os Monstros da Noite”), e que na Inglaterra recebeu o título de “Monsters of the Night”. Foi escrito e dirigido por Michael A. Hoey, um desconhecido cineasta que se inspirou no livro “Monster From Earth´s End”, de Murray Leinster, para escrever e filmar sua história sobre monstros vegetais assassinos oriundos dos segredos do imenso e gelado continente Antártico.


O filme é mais uma produção paupérrima, desconhecida e completamente rara do fascinante gênero fantástico. A cópia que tenho em VHS (e também preservada em DVD) foi gravada de uma exibição na televisão por volta de 1990 pelo SBT, numa madrugada perdida no meio da semana onde eram exibidos alguns filmes dublados e também com legendas em português, justamente para serem voltados a um público com deficiência auditiva. Obviamente que as legendas atrapalharam a exibição, já que elas somente têm valor quando o filme está em sua versão original em inglês ou outro idioma, o que torna essa versão brasileira de “Os Monstros da Noite” ainda mais exótica.


Atenção: O texto a seguir contém spoilers.


A narração do prólogo tem o objetivo de evidenciar o enorme fascínio que o Continente Antártico exerce sobre a humanidade, com seu imenso território gelado e seus segredos desconhecidos para a nossa Ciência. A história do filme começa quando um grupo de cientistas está retornando de uma expedição nessa região de avião para os Estados Unidos trazendo na bagagem animais e plantas para estudos. Uma vez sendo necessário reabastecer com combustível, os pilotos se comunicam com uma base naval americana na Ilha de Gow, no Pacífico Sul, para a realização de um pouso de escala. Porém, momentos antes do avião chegar ao aeroporto da ilha, ocorre um incidente interno e todos os cientistas e o co-piloto misteriosamente se desesperam com algo que viram e se jogam do avião preferindo cair para a morte ao invés de enfrentar um perigo desconhecido vindo do compartimento de cargas da nave. O piloto sobrevivente consegue ainda aterrissar o avião em segurança, mas ele fica em estado de choque e é internado no hospital da ilha.


Os militares em terra, sob o comando do tenente Charles Brown (Anthony Eisley), passam a investigar o misterioso sumiço dos cientistas do avião e retiram as cargas, basicamente composta por pinguins e amostras de árvores, colocando-as num armazém. (Aqui temos uma falha clara, pois os pinguins são animais oriundos de regiões de baixa temperatura, e no avião eles eram transportados em engradados comuns de madeira sem nenhum controle de temperatura, e certamente morreriam no clima quente da ilha). Quanto às arvores, eram estranhas amostras de vegetais colhidas para posteriores pesquisas na América. Segundo os biólogos exploradores da Antártica, elas foram descobertas numa região de 300 milhas quadradas de terra no meio do continente gelado, onde havia um único tipo de vegetação que estava protegido por lagos aquecidos subterrâneos, e que provavelmente eram tão antigos que precediam a própria Idade do Gelo. Daí vem o fascínio da humanidade pela Antártica, povoando o imaginário com seus segredos desconhecidos.


A situação passou a se complicar na base naval da Ilha de Gow quando começam a surgir os primeiros desaparecimentos de oficiais, supostamente assassinados por um “monstro” desconhecido que atacava nas proximidades das instalações. Mais tarde descobriu-se tratar das árvores vindas da Antártica, que adquiriram o poder de se movimentarem sozinhas e matar tudo a sua volta, desde homens, animais e até outras plantas. Elas possuem um líquido ácido que causa queimaduras corroendo a carne humana e como na Antártica a noite dura seis meses, elas desenvolveram um meio de se locomover atrás de alimento, pois somente no verão essas árvores agiam como as normais conhecidas pelo Homem, com suas raízes superficiais retirando o alimento do solo.


Com a capacidade de se multiplicarem rapidamente, os “monstros da noite” estavam tomando conta da ilha e logo iam se apoderar da base naval, porém aviões da Força Aérea Americana ancorados num navio próximo chegam no momento certo para atacar os vegetais assassinos com bombas incendiárias de napalm, e triunfar mais uma vitória do Homem sobre as forças maléficas do desconhecido.


Um destaque é a cena onde um marujo andando inadvertidamente pela floresta, é atacado por uma das árvores carnívoras e tem seu braço esquerdo arrancado pelo vegetal mutante, vindo depois a sofrer uma morte agonizante envolto em ácido corrosivo.


Os atores são medianos e alguns já foram vistos em participações em séries de televisão e o interesse mesmo fica para a beleza da jovem loira Mamie Van Doren, no papel da enfermeira Nora, que está apaixonada pelo tenente Brown, o comandante da base naval da ilha.


“Os Monstros da Noite” é uma produção extremamente barata, com situações que chegam a ser hilariantes, como o relacionamento militar entre os oficiais de patente, com diálogos recheados de gírias (eles eram amigos entre si, mas a arrogante disciplina militar está acima disso, principalmente quando em serviço). Os efeitos, ou melhor, os defeitos especiais são até engraçados na figura das árvores assassinas. Num momento rápido em que um grupo de vegetais ambulantes está caminhando em direção à base naval, podemos notar nitidamente que os “monstros” nada mais são do que estruturas simulando árvores caminhando sobre pequenas rodas, num efeito tosco bem precário. Na cena final com os aviões despejando bombas sobre as plantas mutantes, percebe-se claramente que são imagens aproveitadas de um exercício militar real numa floresta.


“Ilha de Gow. No passado, virtualmente desconhecida do mundo. Hoje, um ponto de referência na luta do Homem contra o desconhecido. Mais um passo à frente na marcha da Ciência.”


Com esse desfecho narrado, após o desfile vitorioso dos aviões que despejaram suas bombas sobre as plantas mortais, uma cena digna do mais puro e convencional clichê, se encerra mais uma produção de baixo orçamento do cinema fantástico. Um filme representante de um amadorismo tão ingênuo que se transforma numa grande diversão para os fãs de peículas “bagaceiras”, ou seja, repletas de situações comuns, interpretações medíocres, história óbvia e cheia de “furos”, efeitos “toscos” e todo tipo de falhas não propositais que tornam a produção um verdadeiro exemplo do cinema “trash”. Apesar da precariedade do filme, vale a pena conhecer “Os Monstros da Noite”, seja pela curiosidade dos fãs do autor de ficção científica Murray Leinster, de cuja obra se baseou o roteiro, ou principalmente pelo entretenimento garantido de um filme completamente raro, incomum e desconhecido da filmografia de ficção científica e horror dos anos 60 do século passado.


Nota do autor: Através do blog “Canibuk”, veio a informação que o filme recebeu o nome de “A Marinha Contra os Monstros” quando chegou ao Brasil, num interessante texto de Coffin Souza sobre o técnico em maquiagem Harry Thomas. Mais detalhes no link:


http://canibuk.wordpress.com/2011/11/18/harry-thomas-monstros-bananas-a-precos-idem/?mid=5307


site: www.bocadoinferno.com.br

blog: www.juvenatrix.blogspot.com (postado em 08/12/05)


Os Monstros da Noite / A Marinha Contra os Monstros (The Navy Vs. The Night Monsters / Monsters of the Night, Estados Unidos, 1966). Duração: 84 minutos. Direção e roteiro de Michael A. Hoey. Produção de George Edwards. Fotografia de Stanley Cortez. Direção de Arte de Paul Sylos. Música de Gordon Zahler. Maquiagem de Harry Thomas. Efeitos Especiais de Edwin Tillman. Som de Del Harris. Baseado no livro “Monster from Earth´s End, de Murray Leinster. Elenco: Mamie Van Doren, Anthony Eisley, Bobby Van, Walter Sande, Phillip Terry, Pamela Mason, Billy Gray, Edward Faulkner, David Brandon, Del West, Kaye Elhardt, Biff Elliot, Taggart Casey, William Meigs, Russ Bender, Garrett Myles, Mike Sargent, Paul Rhone.