Filhos das Trevas (Demons / Demoni, Itália, 1985)


Eles farão de suas catedrais, cemitérios, e de suas cidades, tumbas.

Em meados dos saudosos anos 80 do século passado, no início do mercado de fitas VHS no Brasil, tive oportunidade de alugar numa locadora pequena de bairro, um filme de horror que na época ainda fazia parte das chamadas “fitas alternativas” (depois, foi lançado oficialmente pela “FJ Lucas” e hoje é item raro de colecionadores de vídeo VHS), ou seja, aquelas cópias “piratas” de filmes obscuros. “Filhos das Trevas” (Demons / Demoni) é um filme italiano de 1985 dirigido por Lamberto Bava (filho do lendário cineasta Mario Bava, de “A Máscara de Satã”, 1960) e produzido por Dario Argento (“Suspiria”, 1977).

Um misterioso homem mascarado está fazendo a promoção de um filme, distribuindo para as pessoas nas ruas ingressos para uma sessão numa espaçosa sala de cinema chamada “Metropol”. Cheryl (Natasha Hovey) é uma estudante que recebe ingressos para ela e sua amiga Kathy (Paola Cozzo). Lá chegando, elas encontram outros convidados e entre eles dois amigos, George (Urbano Barberini) e Ken (Karl Zinny), que tentam flertar com as moças. Uma vez iniciado o filme, eles descobrem se tratar de uma história de horror onde um grupo de jovens está explorando as ruínas de um castelo e encontram a tumba do profeta Nostradamus. Um deles pega uma máscara e ao colocar no rosto sofre um corte que infecciona e o transforma num demônio que passa a perseguir os amigos. Num exercício de metalinguagem (filme dentro de um filme), de modo similar à película assistida, os espectadores convidados para a sinistra sessão de cinema no “Metropol” também são atacados por demônios enfurecidos que se apossam das vítimas após uma moça também ter se cortado ao colocar no rosto uma misteriosa máscara que estava exposta na entrada da sala de projeção, transformando-a num demônio sedento pelo sangue e que inicia a contaminação. Resta apenas aos sobreviventes lutar por suas vidas, numa correria desenfreada pelos enormes corredores do cinema, deixando um rastro de sangue e tripas.

“Filhos das Trevas” faz parte de um grupo seleto composto pelos melhores filmes italianos de horror de todos os tempos, com um roteiro simples, mas eficiente, explorando um tema apocalíptico geralmente protagonizado por zumbis, e apenas substituindo-os por demônios enfurecidos e ávidos por destroçar a carne humana. A contaminação é semelhante, através de contato com o sangue, espalhando-se em escala progressiva e fora do controle. E para aqueles que ainda não foram afetados, resta apenas fugir e procurar abrigo, lutando pela sobrevivência num mundo mergulhado no caos.
Os clichês característicos estão presentes como era de se esperar, como o tradicional casal de heróis que se sobressai das demais vítimas e juntos tentam combater a praga demoníaca, com um rapaz comum se transformando num guerreiro que demonstra uma improvável força e habilidade para defender-se e proteger a mocinha da ameaça dos demônios. A overdose de sangue, mutilações, olhos arrancados, gargantas destroçadas, membros decepados, vísceras expostas, feridas pestilentas e gosmas putrefatas jorrando em demasia garantem o entretenimento dos apreciadores de um cinema de horror mais extremo, sem o uso dos artificiais efeitos de computação gráfica, numa época onde os efeitos especiais sangrentos eram produzidos graças à criatividade e talentos dos técnicos em maquiagem.
Na trilha sonora, temos músicas de bandas de Heavy Metal populares na década de 80 como “Motley Crue” (EUA), “Saxon” (Inglaterra) e “Accept” (Alemanha), sendo que esta última emprestou a ultra rápida porrada sonora “Fast as a Shark” para ilustrar uma cena de confronto entre o herói e os demônios, com sangue e tripas espalhados para todos os lados. E curiosamente, tem também uma cena bem absurda quando um helicóptero cai pelo telhado e adentra a sala do cinema, facilitando o trabalho dos roteiristas em descobrir um meio de saída do casalzinho de heróis, e também aproveitando para homenagear os filmes de zumbis de George Romero, especialmente “Despertar dos Mortos” (1978), com a tradicional cena da hélice decepando uma parte do cérebro de uma vítima infectada.
“Demons” teve uma seqüência no ano seguinte, também dirigida por Lamberto Bava, mas utilizando a mesma idéia básica, somente alterando os eventos de uma sala de cinema para um condomínio residencial, investindo ainda mais no quesito violência, porém falhando na intenção de mostrar algo diferente no roteiro.

20/06/10: Em Junho de 2010, a “Cult Classic” lançou em DVD no Brasil um pack contendo “Demons” 1 e 2, e um outro filme também dirigido por Lamberto Bava, mas erroneamente considerado “Demons 3”, chamado “O Ogro”. Na verdade, esse filme já tinha outro nome nacional (“O Terror Não Tira Férias”, de 1988, lançado em VHS), e não tem qualquer relação com a franquia “Demons”.

“Filhos das Trevas” (Demons / Demoni, Itália, 1985) # 519 – data: 19/04/09
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