
“Repentinamente eu imaginei o poder que possuía, o poder
para ordenar, para fazer o mundo rastejar aos meus pés”
O escritor inglês H. G. Wells (1866/1946) foi o autor de uma infinidade
de livros de Ficção Científica e Horror que além de se tornarem muito
conhecidos e cultuados, serviram de inspiração para a produção de inúmeros
filmes. Obras como “A Guerra dos Mundos”, “A Ilha do Dr. Moreau”, “A Máquina do
Tempo”, “Os Primeiros Homens na Lua”, “O Alimento dos Deuses”, tiveram várias
versões adaptadas para o cinema. “O Homem Invisível” (The
Invisible Man, 1933) é outro exemplo de filme baseado em um livro homônimo de
Wells. A direção é de James Whale (1896/1957), o mesmo cineasta de clássicos
como “Frankenstein” (31) e a continuação “A Noiva de Frankenstein” (35), a
produção é do famoso estúdio “Universal”, e o elenco é liderado pelo ator
inglês Claude Rains (1889/1967), de filmes como “O Lobisomem” (41), “O Fantasma
da Ópera” (43), e “O Mundo Perdido” (60). Aliás, Rains ganhou o papel após o
diretor James Whale descartar o grande Boris Karloff, alegando que queria um
ator com uma voz mais “intelectual”, tanto que seu rosto praticamente não
aparece no filme e sua voz passou a ser reconhecida pelo público.
O filme ajudou a imortalizar o
“cientista louco” que se transformou em um “homem invisível” como mais um
personagem marcante no imaginário popular, entrando para a galeria dos vilões
famosos do cinema fantástico, sendo visto numa grande quantidade de filmes, ou
inspirando outros personagens similares. Basta lembrar rapidamente de filmes
recentes de orçamentos milionários que abordaram o tema como “A Liga
Extraordinária” (2003), onde o cientista transparente
Rodney Skinner (feito por Tony Curran) havia sido convocado para integrar uma
liga formada apenas por pessoas com dons diferenciados que teriam um objetivo
especial, e “Quarteto
Fantástico” (2005), sendo que nesse caso temos uma “mulher invisível” (a
belíssima Jessica Alba).
Em “O Homem Invisível”, o Dr. Jack Griffin (Claude Rains) é um
cientista que está obcecado em ganhar fama e respeito no meio científico, e
consegue criar uma fórmula química que testada em si mesmo, transformou-o em invisível. Desesperado
em encontrar um antídoto e poder voltar ao normal, controlando os efeitos do
experimento, ele se refugia num hotel vagabundo numa pequena cidade do
interior, tentando trabalhar sem interferência externa. Porém, após ser
constantemente importunado, e somando-se ao fato da droga experimental ter
afetado significativamente sua mente evidenciando sinais de psicopatia, o
cientista decide se vingar do mundo utilizando a vantagem da invisibilidade
para aterrorizar e instaurar um pânico geral nas pessoas, com a ocorrência de
assassinatos e acidentes, onde nem mesmo a presença acolhedora da bela noiva
Flora (Gloria Stuart), filha de seu chefe, Dr. Cranley (Henry Travers),
consegue convencê-lo a parar com os crimes e ideias mirabolantes de poder.
Ele tenta se unir ao antigo parceiro de trabalho, Dr. Arthur Kemp
(William Harrigan), solicitando sua ajuda para superar as dificuldades geradas
por ser invisível, pois sua nova condição de um homem fora do comum também
trouxe obstáculos a serem enfrentados como o fato de precisar aguardar um certo
tempo até os alimentos serem digeridos e tornarem-se invisíveis, ou evitar
tomar chuva porque a água poderia ser vista nos cabelos molhados ou sobre os
ombros, ou ainda a poluição poderia denunciar uma silhueta preta, um nevoeiro
poderia transformá-lo numa bolha visível, as unhas das mãos e pés teriam que
ser higienizadas a todo momento para impedir que a sujeira possa ser vista,
etc. Mas, assustado com as ideias criminosas de um cientista invisível com a
mente perturbada, o Dr. Kemp tenta denunciá-lo à polícia e o Inspetor Lane
(Donald Stuart) convoca um batalhão de policiais para tentar capturá-lo e
livrar o mundo de sua ameaça.
“Eu acho que irei iniciar um reino de terror”
O filme foi lançado no Brasil em VHS pela “Continental” e também foi
distribuído no formato DVD pela “Universal”. Tem apenas 71 minutos de duração,
a fotografia é em preto e branco e os efeitos especiais de invisibilidade do
cientista são incrivelmente bem feitos, tendo em vista a época da produção, no
início da década de 1930. A
história não perde tempo em grandes explicações, e o filme já começa com o
cientista coberto por bandagens, roupas grossas e óculos escuros para esconder
o fato de ser invisível. Ou seja, ele já se transformou num monstro após servir
de cobaia para suas próprias experiências. Sua mente inicia um processo
crescente de deterioração, ficando confuso e atormentado com os acontecimentos,
e logo ele já é um criminoso caçado pela sociedade. É extremamente interessante
como o protagonista passa rapidamente de um homem da ciência à procura de uma
descoberta que beneficie a humanidade, para um criminoso insano que somente
enxerga as vantagens que teria sendo um homem invisível, cometendo assassinatos
impunemente, roubando bancos e causando acidentes trágicos. Essa ideia é como
uma espécie de aviso de H. G. Wells alertando sobre os perigos das descobertas
científicas.
Curiosamente, temos vários momentos hilários na sequência passada no
hotel, graças à performance da atriz veterana Una O’Connor (que faz o papel da
Sra. Jenny Hall, proprietária da pousada) e seus característicos gritos agudos,
os quais seriam posteriormente também ouvidos dois anos depois em “A Noiva de
Frankenstein”, quando ela encontra a famosa criatura formada de pedaços de
cadáveres, e presenteia o espectador com seus cômicos gritos estridentes. Outra
curiosidade que sempre é comentada é o incrível vacilo que os realizadores de
“O Homem Invisível” cometeram numa cena de grande importância para a história,
quando o cientista invisível caminha pela neve deixando suas pegadas
denunciadoras no caminho, porém o rastro não tem o formato de um pé humano,
apenas de um sapato, desconsiderando o óbvio fato que ele deveria estar
descalço.
A popularidade alcançada por “O Homem Invisível” despertou a atenção da
“Universal” para a produção de outros cinco filmes dentro do mesmo universo
ficcional. Vieram então “A Volta do Homem Invisível” (The Invisible Man
Returns, 40), de Joe May e roteiro de Curt Siodmak, estrelando o ícone Vincent
Price em mais um de seus inúmeros papéis de vilão; “The Invisible Woman” (40),
também escrito por Siodmak, com o cientista interpretado por John Barrymore
transformando a atriz Virginia Bruce em invisível através de uma máquina;
“Invisible Agent” (42), novamente com roteiro de Siodmak e com Peter Lorre;
“The Invisible Man’s Revenge” (44), escrito por Bertram Milhauser, e finalmente
a comédia “Abbott and Costello Meet the Invisible Man” (51). Vincent Price
também fez uma participação especial e super rápida emprestando sua voz para o
homem invisível na cena final da comédia “Abbott e Costello Encontram
Frankenstein” (48).
Na televisão, as duas principais séries que abordaram o tema são
produções americanas. “The Invisible Man” (1975/76), da NBC, com David McCallum
sendo um agente invisível do governo americano que destrói a fórmula química
para que os militares não fizessem um uso indevido dela, e “Gemini Man” (76),
com Ben Murphy se transformando em invisível graças a uma modificação nas
moléculas do DNA após um acidente que explodiu um laboratório secreto do
governo, sendo que ele tem a vantagem de controlar o efeito, revertendo o
processo sempre que desejar com o auxílio de um instrumento que carrega preso
no pulso.
Além das cultuadas produções da “Universal” e das populares séries de
TV, a filmografia que utiliza as idéias de Wells e seu “homem invisível” é
imensa, com muitos outros filmes, mas nada significativo o suficiente para
merecer alguma citação especial.
“O Homem
Invisível” (The Invisible Man, Estados Unidos, 1933) # 449 – data:
03/07/07
www.bocadoinferno.com.br
www.juvenatrix.blogspot.com.br (postado em
04/07/07)
O Homem
Invisível (The
Invisible Man, Estados Unidos, 1933). Universal. Preto e Branco. Duração: 71
minutos. Direção de James Whale. Roteiro de R. C. Sheriff e Philip Wylie,
baseado em livro de Herbert George Wells. Produção de Carl Laemmle Jr..
Fotografia de Arthur Edeson. Direção de Arte de Charles D. Hall. Efeitos
Especiais de John P. Fulton. Elenco: Claude Rains (Dr. Jack Griffin), Gloria
Stuart (Flora Cranley), William Harrigan (Dr. Arthur Kemp), Donald Stuart
(Inspetor Lane), Henry Travers (Dr. Cranley), Forrester Harvey (Herbert Hall).