Battle Beyond the Sun (Nebo Zovyot, URSS / EUA, 1959 / 1962)

 


“Nos anos seguintes a grande guerra nuclear, quase toda a população desapareceu sobre a Terra devastada. Aqueles que sobreviveram à tragédia, esperavam por uma nova vida, um novo futuro. Mas o mundo estava novamente dividido. Desta vez, foram erguidas novas fronteiras. O mundo estava dividido em duas partes. As duas potências foram chamadas de poderes: Hemisfério Norte e Hemisfério Sul.”

 

Em 1959 a antiga União Soviética lançou o filme de ficção científica “Nebo Zovyot”, dirigido por Aleksandr Kozyr e Mikhail Karyukov. A produtora americana “American International”, de Roger Corman, como sempre atenta em oportunidades de gerar lucros, comprou os direitos do filme russo e fez a sua versão em 1962 com o título “Battle Beyond the Sun”, sob a responsabilidade de Francis Ford Coppola (o cultuado diretor da trilogia “O Poderoso Chefão” e de “Apocalypse Now” começou a carreira na equipe de Corman), utilizando o pseudônimo Thomas Colchart. Dublando em inglês reduzindo o tempo original passando para apenas 64 minutos de duração, alterando alguns diálogos, especialmente questões relacionadas aos soviéticos, e acrescentando algumas cenas novas, como a luta entre dois monstros fuleiros de exploração, simulando genitálias masculina e feminina, no melhor estilo do cinema de horror divertido e bagaceiro de Roger Corman.

 

Ambientado em 1997, um futuro distante para a época da produção, após a inevitável destruição do planeta com bombas atômicas, conforme informa a introdução narrada e reproduzida parcialmente no início desse texto, o novo mundo pós-apocalipse continua dividido em dois grandes países, o do Norte e o do Sul. As viagens espaciais com foguetes já são corriqueiras e a humanidade lançou uma estação em órbita da Terra. Mantendo uma rivalidade política entre as duas grandes potências do planeta, o foco agora é uma corrida espacial para chegar em Marte, o fascinante e ainda desconhecido planeta vermelho.

Enquanto o Hemisfério Sul saiu na frente, num projeto liderado pelo cientista Dr. Albert Gordon (Ivan Pereverzev) e o assistente Craig Matthews (Aleksandr Shvorin), que partem para Marte na nave “Mercury”, o Hemisfério Norte tenta reagir com o cientista Dr. Martin (Konstantin Bartashevich) e o Capitão Torrance (Gurgen Tonunts), que viajam no foguete “Typhoon”. Porém, a influência do campo magnético do Sol os direciona a caminho da destruição.

A nave do Sul decide abandonar a missão e parte em socorro dos rivais, e uma vez todos juntos eles são obrigados a aterrissar numa lua de Marte, ficando sem combustível. Outro foguete é enviado em missão de resgate, com o astronauta Paul Clint (Valentin Chernyak), mas ele não imaginaria que teria que enfrentar uma dupla de monstros bizarros.        

 

A versão americana “Battle Beyond the Sun” pode ser encontrada no “Youtube” com a opção de legendas em português. O roteiro explora a tensão da guerra fria entre EUA e URSS num período turbulento com ameaças constantes de bombas de destruição em massa, tanto que a história futurística mostra o mundo depois do apocalipse nuclear e que continua dividido em dois grandes blocos antagônicos.

A narrativa é lenta, fato que sempre incomoda apesar do filme ser curto com pouco mais de uma hora de duração. E o que realmente interessa para os apreciadores do cinema fantástico bagaceiro são os divertidos efeitos práticos dos foguetes viajando pelo espaço exterior, a imensa estação espacial, as enormes bancadas cheias de botões, luzes piscando e mostradores analógicos, e as cenas no asteroide, com o ataque dos monstros fuleiros ao estilo dos filmes baratos de Corman (com direito a um pôster sensacionalista destacando os monstros, mesmo com participação pequena). Os realizadores russos tentaram fazer um filme mais sério, ao contrário de Corman e sua equipe, especialistas em apresentar elementos bagaceiros para agradar os fãs de suas tranqueiras. Os efeitos práticos são bastante toscos e datados quando em comparação com a computação gráfica do cinema moderno, mas são muito eficientes e impressionáveis para a época da produção.   

 

(RR – 30/08/23)







Jesse James Contra a Filha de Frankenstein (Jesse James Meets the Frankenstein´s Daughter, EUA, 1966)

 


“Você não é mais Hank Tracy. Você é Igor. Você entendeu? Igor! Assim você será conhecido. Eu sou Maria Frankenstein. Como eu penso, você vai pensar. Nós somos um. Eu vou comandar. Você vai obedecer. Você viverá tanto quanto eu desejar. Você morrerá quando eu ordenar. Lembre-se, você estará sempre sob o meu controle.” – Dra. Maria Frankenstein para a criatura Igor

 

O cinema bagaceiro de ficção científica e horror tem como características, além dos efeitos práticos precários devido aos orçamentos reduzidos e falta de recursos, os roteiros exagerados no escapismo, repletos de situações improváveis e inverossímeis. Então imaginem uma mistura desses gêneros do cinema fantástico com o “western”, naquilo que podemos chamar de “crossover”, e ainda juntando numa mesma história monstros clássicos do horror e vilões históricos do velho oeste americano. O resultado pode ser conferido na tranqueira com título sonoro “Jesse James Contra a Filha de Frankenstein” (Jesse James Meets the Frankenstein´s Daughter, EUA, 1966), de William Beaudine, disponível no “Youtube” com a opção de legendas em português.

 

A Dra. Maria Frankenstein (a estoniana Narda Onyx), envolvida em experiências sinistras com cobaias humanas, é obrigada a fugir das autoridades de seu país natal, Áustria, juntamente com o irmão bem mais velho Dr. Rudolph (Steven Geray), chegando aos Estados Unidos e se estabelecendo na fronteira com o México numa mansão macabra. A intenção da “cientista louca” é continuar as pesquisas obscuras de sua família, encontrando nas terras isoladas a tranquilidade necessária para seu trabalho científico utilizando os camponeses locais para os testes e a energia elétrica para seus aparelhos com as fortes tempestades que ocorrem regularmente na região.

Sua presença assusta os moradores mexicanos de uma vila próxima, que decidem abandonar o local, mas a bela camponesa Juanita Lopez (a cubana Estelita Rodriguez, em seu último filme, falecendo ainda em 1966) decide ficar para vingar a morte do irmão adolescente, e a cientista ainda precisa lidar com a desaprovação do irmão na continuidade das experiências com a morte recorrente das cobaias.

Em paralelo, o famoso ladrão Jesse James (John Lupton), juntamente com o forte e fiel parceiro Hank Tracy (Cal Bolder), surge na cidade para um roubo de carregamento de dinheiro, e eles são perseguidos pelo xerife McPhee (Jim Davis). Uma vez ferido, o grandalhão Hank é socorrido pela cientista, que aproveita a oportunidade para utilizá-lo em suas experiências com transplante de cérebro, transformando-o em Igor, conforme sua empolgada dissertação reproduzida no início desse texto.

Com a ocorrência de um estranho triângulo amoroso entre Juanita, Jesse James e a Dra. Frankenstein, a ideia é tentar impedir o sucesso das experiências da cientista e evitar mais assassinatos praticados pelo zumbificado Igor.  

  

“Jesse James Contra a Filha de Frankenstein” explora o velho e desgastado clichê sobre “cientistas loucos”, sendo que no caso é uma mulher da ciência, a neta de Frankenstein (evidenciando um erro no título do filme), pegando inspiração no famoso nome e nas experiências macabras com seres humanos, misturando com elementos de western, na ambientação do velho oeste selvagem americano e utilizando um vilão tradicional do gênero, o ladrão Jesse James. O resultado dessa salada toda é mais uma tranqueira que até garante alguma diversão rápida justamente pelos absurdos do roteiro e efeitos práticos toscos.

Tem alguns momentos de horror gótico com a mansão (com o plano geral sendo retratado por uma pintura) e laboratório bizarro (curiosamente são os mesmos instrumentos elétricos dos filmes de Frankenstein da “Universal”, que agora podem ser vistos em cores), além do capacete colorido com eletrodos e a própria “criatura de Frankenstein”, com a cabeça costurada abrigando um cérebro artificial. E tem também a história clichê do velho oeste com a mocinha se apaixonando pelo vilão que é perseguido pelo xerife, num ambiente selvagem onde tudo se resolve com o saque de revólveres.  

O diretor William Beaudine (1892 / 1970), que teve uma carreira imensa com centenas de créditos, também é o responsável por outro filme similar misturando horror com western e personagens clássicos, “Billy the Kid versus Dracula” (1966), com o lendário ator John Carradine no papel do vampiro.

 

(RR – 22/08/23)






Stranger From Venus / The Venusian / Immediate Disaster (EUA / Inglaterra, 1954, PB)

 


“Não tem pulso. Existem duas explicações possíveis para isto; eu estou bêbado ou você está morto.” – Dr. Meinard para o "Estranho de Vênus"

 

Nos anos 1950 foram lançados muitos filmes com elementos de horror e ficção científica abordando a temática de invasão alienígena, na maioria das vezes com intenções hostis e de conquista. Mas também tivemos alguns casos de seres do espaço visitando nosso planeta com objetivos pacíficos, alertando a humanidade dos perigos do uso indevido da energia nuclear para a criação de bombas e armas de destruição em massa, tema que preocupava o mundo após o fim da Segunda Guerra Mundial e início da guerra fria com a corrida armamentista entre Estados Unidos e a antiga União Soviética.

Um exemplo desses filmes com alienígenas pacifistas é “O Monstro da Era Atômica” (The Cosmic Man, 1959), com John Carradine, mas o principal representante é o clássico “O Dia Em Que a Terra Parou” (The Day the Earth Stood Still, 1951), de Robert Wise e com Michael Rennie e Patricia Neal, além do robô Gort, figura emblemática na história do cinema de ficção científica.

Em 1954 foi lançado “Stranger From Venus”, dirigido por Burt Balaban, uma co-produção entre EUA e Inglaterra na mesma ideia e curiosamente também com a atriz Patricia Neal, que tem o nome estampado em destaque no cartaz de divulgação. Também conhecido como “The Venusian” e “Immediate Disaster”, felizmente para os apreciadores das divertidas bagaceiras antigas, o filme está disponível no “Youtube” com a opção de legendas em português, e tanto na versão original em preto e branco quanto na colorizada por computador.

 

Um humanoide do planeta Vênus (o austríaco Helmut Dantine), o “estranho” do título original, aterrissa no interior da Inglaterra e salva a vida de Susan North (Patricia Neal), vítima de um acidente de carro causado justamente pela interferência luminosa da nave extraterrestre. Ele pede hospedagem no pequeno hotel de Tom (Willoughby Gray) e sua filha Gretchen (Marigold Russell). Extremamente misterioso, ele tem a capacidade de ler mentes, curar doenças, falar vários idiomas, afirma não ter um nome nem dinheiro, além da ausência de sinais digitais nos dedos das mãos e ao ser examinado por outro hóspede, o médico Dr. Meinard (Cyril Luckham), acabou gerando a inusitada declaração do início desse texto. Depois de mais ambientado, o venusiano revela que sua missão é de paz e solicita uma reunião com os líderes políticos mundiais para alertar sobre os perigos da fissão nuclear e bombas atômicas.

Um político funcionário do governo inglês, Arthur Walker (Derek Bond), noivo de Susan, é o encarregado de convocar essa reunião. Mas o alienígena é traído pelas autoridades inglesas, numa comissão formada entre outros, pelo militar General (Stanley Van Beers), o jornalista Charles Dixon (Kenneth Edwards) e o cientista (Arthur Young). Eles querem primeiramente se beneficiar com a obtenção de conhecimentos tecnológicos avançados como o sistema de navegação da nave por energia magnética.   

  

 “Stranger From Venus” é curto com apenas uma hora e quinze minutos, e a história concentra-se na ideia de um alerta alienígena sobre a energia nuclear para fins bélicos, colocando em risco a estabilidade da Terra, a continuidade de nossa espécie e a segurança do sistema solar, incluindo Vênus. Sem monstros de olhos esbugalhados e naves espaciais imponentes e conquistadoras, temos apenas uma cena rápida e mais próxima do final com um tradicional disco voador tosco obtido com efeitos práticos divertidos.

Monstros e naves bagaceiras são sempre muito bem-vindos, mas é compreensível que pela escassez de recursos de uma produção de orçamento reduzido, a opção dos realizadores foi priorizar a história de invasão alienígena pacifista, com uma narrativa mais lenta e muitos diálogos. A mensagem do venusiano é totalmente pertinente, avisando dos riscos e consequências perigosas de uma área da ciência ainda desconhecida, num momento conturbado de hostilidade entre nações rivais.      

 

(RR – 15/08/23)





A Torre de Londres (Tower of London, EUA, 1962, PB)

 


“São nossos atos que escurecem o céu, ou o céu que escurece a alma do Homem?

 

Durante o cultuado ciclo de filmes da década de 1960 inspirados em histórias de Edgar Allan Poe, na parceria entre o diretor Roger Corman e o ator Vincent Price, tivemos uma pausa para o lançamento de “A Torre de Londres” (Tower of London, 1962), um horror gótico com fotografia em preto e branco e que está disponível no “Youtube” em versão original com opção de legendas em português.

Dirigido por Roger Corman, produzido por seu irmão Gene Corman e estrelado pelo ícone do horror Vincent Price, é refilmagem de uma produção da “Universal” de 1939 dirigida por Rowland V. Lee e com Basil Rathbone e Boris Karloff, além do próprio Price em outro papel.

 

No século XV, após a morte do Rei da Inglaterra, seu irmão Richard de Gloucester (Vincent Price), um tirano com deformação no ombro, é nomeado Protetor do Reino e auxiliado pelo comparsa de crimes Sir Ratcliffe (Michael Pate), não mede esforços para conquistar o trono do Rei. Para isso, ele planeja eliminar todos que cruzarem seu caminho ou que possam criar algum empecilho para seu objetivo obscuro, incluindo membros de sua própria família como o irmão George, Duque de Clarence (Charles Macaulay), e criados como a jovem Srta. Shore (Sandra Knight).

Para tentar impedir seu sucesso, um grupo une esforços para proteger os herdeiros legítimos do Rei, seus dois filhos pequenos, o Príncipe Richard (Donald Losby) e o sucessor do trono Edward V (Eugene Mazzola). O grupo é formado por Sir Justin (Robert Brown), sua namorada Lady Margaret (Joan Freeman), a rainha (Sarah Selby) e o curandeiro Tyrus (Richard Hale).

Com as mãos sujas de sangue e a consciência atormentada, o desonesto e conspirador Richard de Gloucester vai perdendo lentamente a sanidade ao ser assombrado por visões e vozes dos fantasmas de suas vítimas, que vagando no limbo sem paz, procuram por vingança contra seu perverso algoz.  

  

 “A Torre de Londres” de Roger Corman tem uma inclinação maior para o horror em vez do drama histórico do filme da “Universal”. E logo já sabemos se tratar de mais uma divertida produção de baixo orçamento com as tradicionais características do cinema de Corman. O filme é curto com apenas 79 minutos, e tem o diferencial da presença ilustre de Vincent Price, ator totalmente associado ao gênero com uma vasta e valiosa carreira, principalmente com personagens vilões e com a já reconhecida atuação que o imortalizou na galeria de atores lendários do horror.

A diversão dos fãs de filmes atmosféricos é garantida pelo imponente castelo com câmara de torturas no subsolo, pela família amaldiçoada com atos de traição e assassinatos, além dos fantasmas atormentados assombrando os cantos escuros e a mente perversa do vilão.

Curiosamente, a história tem alguma inspiração no poeta e dramaturgo William Shakespeare, que não foi creditado. E como característica nos filmes de orçamentos reduzidos de Corman, as cenas da batalha de Bosworth foram reaproveitadas do filme de 1939.

 

(RR – 08/08/23)