O Círculo do Diabo (The Devil´s Hand, EUA, 1961, PB)




“Oh Camba, grande deus do mal, senhor dos destinos humanos. Oferecemos essa bela jovem no altar do sacrifício. O senhor, em sua sabedoria, vai julgá-la. Se duvida de sua lealdade, ela deve ser punida. Mas se for digna de servi-lo, seu poder irá poupá-la.”

 

O cinema de horror possui uma grande quantidade de subgêneros bem diferentes entre si, e todos eles, de uma forma ou de outra, acabam satisfazendo as mais diversas e variadas expectativas dos fãs.

E mais especificamente, para aqueles que apreciam filmes antigos, fotografados em preto e branco, produzidos com baixo orçamento, de curta duração (somente 70 minutos), apresentando uma história simples e despretensiosa, sem cenas de ação, sustos, barulheiras, correrias desenfreadas nem efeitos especiais, e apenas investindo num horror sutil, discreto e sugerido (com ausência de sangue ou violência), vale citar “O Círculo do Diabo” (The Devil’s Hand, 1961).

O filme, dirigido por William J. Hole Jr. a partir de um roteiro de Jo Heims, foi lançado em DVD no Brasil em 2005 pelo selo “Dark Side” da “Works Editora”, e também está disponível no “Youtube” no canal “Cult Cinema Classics”, com opção de legendas em português. A história básica aborda as atividades secretas de um grupo de satanistas que veneram um demônio obscuro chamado Camba.

 

Rick Turner (Robert Alda) está enfrentando uma crise de sono com várias noites seguidas sem dormir por causa de pesadelos que mostram uma bela mulher dançando sugestivamente para ele, preocupando sua noiva Donna Trent (a mexicana Ariadna Welter). Em certo momento, de forma misteriosa, ele descobre uma loja de bonecas de propriedade de Francis Lamont, o líder de uma seita satânica. Ele é interpretado por Neil Hamilton, mais conhecido como o Comissário Gordon em todos os 120 episódios da série de TV “Batman e Robin”, 1966/68. Na estranha loja, o Sr. Turner encontra uma boneca com o rosto da mulher de seus sonhos perturbadores, além também de ver outra boneca com a fisionomia de sua noiva Donna.

Intrigado pela incrível coincidência, o homem decide investigar o caso e descobre que a mulher que tenta se comunicar com ele nos sonhos através de projeção de pensamentos é Bianca Milan, uma das seguidoras do culto demoníaco. Interpretada pela também mexicana Linda Christian, que curiosamente era irmã na vida real de Ariadna Welter, no único filme em que atuaram juntas.

Os envolvidos na seita possuem bonecas esculpidas conforme suas imagens, aprisionando suas almas através de magia negra. O Sr. Turner inevitavelmente se apaixona pela bela mulher de seus devaneios oníricos, tornando-se mais um membro da sociedade secreta de adoradores do diabo Camba, enquanto em paralelo sua noiva é internada num hospital com fortes dores misteriosas pelo corpo.

 

Após ver o filme, surge nitidamente uma impressão de se tratar de um episódio mais longo da série de TV “Além da Imaginação” (The Twilight Zone, 1959/64), criada por Rod Serling (1924/75), e que era conhecida por apresentar histórias voltadas para o gênero fantástico. Pois o roteiro de “O Círculo do Diabo” parece se encaixar perfeitamente na série, desde o tema abordado, uma seita de seguidores de uma entidade maligna, passando pela produção modesta e a ideia totalmente despretensiosa de contar uma história simples com elementos sugestivos de horror. E por apresentar essas características, o filme deverá não agradar aqueles que esperam justamente o contrário, sangue em profusão, violência exagerada, suspense perturbador, sustos fáceis, ação, reviravoltas ou surpresas.

Como pontos positivos e de destaques, podemos citar o argumento da seita satânica e seus rituais macabros de sacrifício humano, um tema explorado no início dos anos 60, num momento que ainda não estava saturado, fato que inevitavelmente aconteceu nas décadas seguintes. Tem também a presença da bela atriz Linda Christian como uma bruxa moderna, além da tentativa de mostrar um desfecho fora do convencional, pendendo para um pessimismo sutil na eterna disputa do Bem contra o Mal.

Já ao contrário, são bem evidentes vários furos no roteiro em situações forçadas, principalmente o fato de Rick Turner se converter tão rápido e facilmente como um adepto da seita demoníaca, se bem que a beleza escultural de Bianca poderia explicar o feitiço exercido sobre ele. Mas, ainda assim, pareceu inverossímil sua aproximação dos satanistas, sem grandes questionamentos ou resistência. A seita, por sua vez, também tinha liberdade em excesso para agir e realizar seus rituais, apesar da tentativa fracassada de denúncia através de um jornalista infiltrado entre eles.

Se fizermos uma análise crítica mais rigorosa, certamente encontraríamos várias falhas e situações mal explicadas que poderiam diminuir a diversão, por isso o melhor a fazer é assistir de forma tranqüila e sem compromisso, como um episódio da saudosa “Além da Imaginação”, pois é mais um filme “B” recomendado sem exigência para os colecionadores e fãs de produções menores de horror sugerido. 

Entre as curiosidades, os realizadores de “O Círculo do Diabo” tiveram problemas financeiros ao longo da produção e alguns atores enfrentaram dificuldades para serem pagos. O filme recebeu outros nomes alternativos como “Devil’s Doll”, “Live to Love”, “The Naked Goddess” e o manjado e repetitivo “Witchcraft”.

 

O Círculo do Diabo” (The Devil’s Hand, Estados Unidos, 1961) # 382 – data: 23/05/06 – avaliação: 6 (de 0 a 10)

site: www.bocadoinferno.com.br / blog: www.juvenatrix.blogspot.com.br (postado em 24/05/06)

 

(RR – Escrito originalmente em 05/2006 e revisado em 03/2024)





The Crawling Hand (EUA, 1963, PB)

 


O tema da mão isolada ou junto com o braço, que ganha vida própria e torna-se uma ameaça mortal, seja com seu corpo original ou separado dele, foi bem explorado no cinema de horror e ficção científica.

Exemplos não faltam, como “The Hands of Orlac”, também conhecido como “Mad Love” (1935), de Karl Freund e “The Beast With Five Fingers” (1947), de Robert Florey, ambos estrelados por Peter Lorre. No primeiro, um pianista perde suas mãos num acidente de trem e recebe um transplante de mãos de um assassino, as quais adquirem vida própria e o obrigam a cometer crimes. O outro conta a história também de um pianista que tem uma mão decepada, ganha vida e passa a rastejar em busca de vítimas. O estúdio inglês “Amicus” produziu a antologia “Dr. Terror´s House of Horrors” em 1965, onde uma das histórias, “The Crawling Hand”, estrelada por Christopher Lee, apresenta um crítico de arte sendo atormentado pela mão decepada de um artista, que passa a persegui-lo à procura de vingança. Em 1981 tivemos “A Mão” (The Hand, 1981), de Oliver Stone, onde um cartunista tem a mão decepada num acidente de carro, prejudicando sua profissão, enquanto mortes bizarras acontecem envolvendo a mão decepada. E em “Evil Dead 2” (1987), de Sam Raimi, o carismático Ash (Bruce Campbell) luta contra sua própria mão cortada que estava possuída por um demônio.

 The Crawling Hand” (1963), de Herbert L. Strock, é outro filme abordando a mesma temática, com fotografia original em preto e branco e com uma versão colorizada por computador, disponíveis no “Youtube” com opção de legendas em português.

 

Uma missão espacial americana para a Lua é coordenada pelos cientistas Steve Curan (Peter Breck) e Dr. Max Weitzberg (Kent Taylor). Porém, a missão falha e o foguete explode no espaço, matando o astronauta Capitão Melvin Lockhart (Ashley Cowan, não creditado). Destroços da cápsula espacial caem numa praia da Califórnia e um casal de estudantes namorados, Paul Lawrence (Rod Lauren) e Marta Farnstrom (Sirry Steffen), encontra um braço decepado com restos de traje espacial. Controlado por uma força misteriosa fora do planeta, a “mão rastejante” (do título original) ganha vida própria e começa a matar as pessoas e controlar a mente do jovem Paul, despertando a investigação policial do xerife Townsend (Alan Hale Jr.).      

 

A ideia básica do roteiro, exagerada no escapismo ao explorar uma mão assassina com vida própria, manipulada por algo de outro mundo e rastejando à procura de vítimas, é bem interessante justamente por sua bizarrice, combinando com a sempre esperada diversão no cinema fantástico bagaceiro. Mas, é lamentável constatar que em “The Crawling Hand” os realizadores optaram por priorizar excessos de diálogos entediantes, desperdiçando momentos preciosos com situações irrelevantes, num ritmo arrastado e sonolento, em vez de investir mais nas cenas de ataques da mão possuída, com efeitos práticos toscos simulando os movimentos próprios do braço amputado assassino.   

 

RR – 06/03/24)