A Vingança do Monstro (Tobor the Great, EUA, 1954, PB)

 


Logo após o fim da Segunda Guerra Mundial, com a turbulência política polarizada entre as duas grandes potências da época, Estados Unidos e antiga União Soviética, iniciou-se uma guerra fria com desconfiança mútua e que trouxe ao mundo uma paranoia do apocalipse nuclear, um medo terrível que a humanidade aniquilasse o próprio planeta.

Surgiram a partir daí muitos filmes de ficção científica e eventualmente com elementos de horror, explorando o medo de uma guerra com bombas atômicas e a necessidade de uma corrida armamentista e conquista espacial.

Em 1954, a “Republic”, uma distribuidora de filmes com orçamentos reduzidos, lançou “A Vingança do Monstro” (Tobor the Great), com fotografia em preto e branco, duração curta de apenas 76 minutos e direção de Lee Sholem, apresentando uma história com um enorme robô (o “Tobor” do título original, que na verdade é “robot” soletrado de trás para frente), que foi criado para pilotar o primeiro foguete americano rumo ao espaço.

 

Os cientistas Prof. Arnold Nordstrom (Taylor Holmes) e Dr. Ralph Harrison (Charles Drake) estão trabalhando no programa espacial americano, no desenvolvimento de foguetes nucleares. Eles concordam que é muito perigoso a utilização de astronautas humanos nos testes dos voos espaciais, arriscando suas vidas em protótipos de foguetes experimentais. Como solução alternativa, o Prof. Nordstrom constrói um robô enorme ou um simulador elétrico do Homem, como ele definiu, uma espécie de ser sensitivo com instinto sintético, comandado pela percepção extra-sensorial do seu criador.

Brian Roberts (Billy Chapin), o inteligente neto de apenas onze anos do Prof. Nordstrom, acaba criando uma relação de amizade com o robô, sempre supervisionado pelo avô e acompanhado à distância pela mãe viúva do rapaz, Janice Roberts (Karin Booth). Porém, logo o extraordinário robô desperta a atenção de espiões estrangeiros infiltrados nos Estados Unidos, interessados em sua tecnologia voltada para fins militares, a criação de um exército de robôs com estímulos destrutivos, e na disputa da corrida espacial da guerra fria, devido suas habilidades na pilotagem de foguetes.

 

“A Vingança do Monstro” (título nacional mal escolhido e apelativo) é mais uma daquelas preciosidades do cinema fantástico antigo de baixo orçamento. Sim, o roteiro é simples, previsível e ingênuo, o elenco é apenas esforçado, os efeitos são toscos, mas a soma disso tudo é diversão garantida, principalmente pelas cenas com Tobor (uma em especial é hilária, quando ele está dirigindo um jipe). Ele  também é um dos robôs que ficaram eternizados, apesar de bem menos conhecido. Mesmo num patamar menor, certamente está figurando ao lado de outros mais populares e clássicos como “Maria” (“Metropolis”, 1926), “Gort” (“O Dia Em Que a Terra Parou”, 1951), “Robby” (“Planeta Proibido”, 1956) e “B-9” (série de TV “Perdidos no Espaço”, 1965-1968).

A casa do Prof. Nordstrom, onde em seu laboratório subterrâneo ele inventou o robô piloto espacial, é repleta de aparelhos e dispositivos tecnológicos altamente impressionáveis na época, com sistemas sofisticados de alarme e monitoramento por telas, e que certamente soam comuns e antiquados para nosso tempo. Mas, são justamente características como essas que despertam a curiosidade dos apreciadores do cinema bagaceiro. 

Curiosamente, numa jogada de marketing muito utilizada na época com filmes similares, os cartazes de divulgação mostram o robô Tobor segurando em seus braços uma bela mulher, o que não acontece no filme. Na verdade, ele apenas carrega nos braços o neto do cientista, o garoto com quem cria um laço de afeição.

 

(RR – 30/09/20)






O Poço e o Pêndulo / A Mansão do Terror (The Pit and the Pendulum, EUA, 1961)

 


“Está prestes a entrar no inferno. Inferno! O mundo das profundezas. A região infernal. A morada dos condenados. O local da tormenta. Pandemônio, Abbadon, Tophet, Gehenna, Naraka, o Poço! E o Pêndulo! A lâmina do limiar do destino.”


Nos anos 60 do século passado, o cultuado diretor e produtor Roger Corman, conhecido por sua habilidade em fazer ótimos filmes com orçamentos reduzidos, teve uma parceria produtiva com o ator Vincent Price, um dos grandes astros do cinema de Horror em todos os tempos, para a adaptação nas telas de alguns contos do escritor Edgar Allan Poe.

Dessa união de talentos saíram filmes divertidos e memoráveis como “O Solar Maldito” (1960), “O Poço e o Pêndulo” (The Pit and the Pendulum, 1961), que é o assunto dessa resenha, “Muralhas do Pavor” (1962), “O Castelo Assombrado” (1963), sendo este apenas levemente inspirado em Poe e com uma história de H. P. Lovecraft, “O Corvo” (1963), “A Orgia da Morte” (1964) e “Túmulo Sinistro” (1964). Alguns deles tiveram o roteiro assinado pelo especialista Richard Matheson, outro nome eternizado na história do cinema fantástico.

Para completar as várias atrações com nomes de personalidades associadas ao Horror, temos ainda a presença da “scream queen” Barbara Steele (“A Maldição do Demônio”, 1960) e produção executiva da “American International” de Samuel Z. Arkoff e James H. Nicholson.


A história de “O Poço e o Pêndulo” foi ambientada na Espanha do século XVI, na terrível época da Santa Inquisição, com o assassinato cruel e práticas de tortura em homens e principalmente mulheres acusadas falsamente de bruxaria, a favor de interesses dos poderes religiosos que dominavam a Europa.

Nesse cenário de devastação e prova da hipocrisia da raça humana, vivia Nicholas Medina (Vincent Price), filho do terrível inquisidor Sebastian Medina (também Price), num castelo imponente no alto de um morro rodeado pelas ondas furiosas do mar. Ele era atormentado pela herança maldita do pai assassino de inocentes, com uma câmara imensa no porão do castelo, repleta de instrumentos de tortura que só de olhar já sentimos dor.

Apesar do ambiente sinistro, ele era feliz com sua amada esposa Elizabeth Barnard Medina (Barbara Steele). Porém, após a morte misteriosa da bela mulher, chegou ao castelo o irmão Francis Barnard (John Kerr), vindo da Inglaterra para investigar e obter mais informações sobre a morte de Elizabeth.

O jovem inglês foi recebido por Catherine Medina (Luana Anders), irmã de Nicholas, que estava no castelo para cuidar do irmão triste e deprimido com a morte da esposa. Mesmo depois das explicações do médico da família Dr. Charles Leon (Antony Carbone) sobre a morte inesperada de Elizabeth num colapso nervoso ao visitar a câmara de torturas, o recém chegado visitante não se convenceu e se instaurou um clima de desconfiança no castelo, com consequências trágicas para todos.

 

“O Poço e o Pêndulo” também é conhecido no Brasil pelo título “A Mansão do Terror”. O filme tem todos os elementos normalmente encontrados no horror gótico, com um castelo tétrico cheio de aposentos imensos, móveis antigos, iluminação por velas e candelabros, ruídos constantes nos cantos escuros de gelar a espinha e o principal, uma câmara com instrumentos de tortura que foram responsáveis pelo sofrimento e morte dolorosa de muitas pessoas vítimas da Inquisição. Membros torcidos e quebrados, olhos arrancados das órbitas, carne sendo queimada até ficar preta. E um poço infernal com um pêndulo segurando uma lâmina imensa para dilacerar o abdômen das vítimas presas deitadas numa cama de pedra.

Alguns dos temas recorrentes na obra literária de Edgar Allan Por como maldição familiar, loucura, insanidade, conspiração, traição, vingança e a paranoia de ser enterrado ou emparedado vivo, estão presentes na atmosfera perturbadora do castelo, garantindo a diversão dos fãs do cinema de horror gótico e dos ícones do estilo como Roger Corman, Vincent Price e Richard Matheson.

Curiosamente, os cenários da câmara de tortura foram utilizados também em outro filme de Corman, “Sombras do Terror / Terror no Castelo” (The Terror, 1963), com Boris Karloff e Jack Nicholson. E um dos principais instrumentos de tortura é a “donzela de ferro” (“iron maiden”, que serviu de inspiração para o nome da famosa banda de Heavy Metal), um ataúde de ferro que mantinha uma pessoa presa em seu interior, com cravos que perfuravam o corpo da vítima, que agonizava lentamente ensanguentada.

Em 1991 a produtora “Empire Pictures” lançou outro filme inspirado nesse mesmo conto de Edgar Allan Poe, dirigido por Stuart Gordon e com Lance Henriksen e Jeffrey Combs.   


“... o tormento da minha alma foi extravasado em um alto, demorado, e final grito de desespero.” – Edgar Allan Poe


 (RR – 29/09/20)






Sexta-Feira 13 (Black Friday, EUA, 1940, PB)


Quando nos deparamos com um filme com o título nacional “Sexta-Feira 13”, logo vem à cabeça a popular franquia “slasher” com o psicopata mascarado Jason Voorhees, um ícone da cultura pop, com seu primeiro filme lançado em 1979 (Friday the 13th). Porém, existe outro filme com o mesmo nome nacional e título original “Black Friday”, com fotografia em preto e branco, produção de baixo orçamento do longínquo ano de 1940, e com dois dos maiores astros do cinema de horror de todos os tempos, o inglês Boris Karloff (famoso principalmente pelo papel do “monstro de Frankenstein”) e o húngaro Bela Lugosi (eternizado como o vampiro “Drácula” nos filmes da “Universal”). Sexta-Feira 13” tem direção de Arthur Lubin e roteiro de Eric Taylor e do alemão Curt Siodmak, autor conhecido pelas histórias de diversos outros filmes como “O Lobisomem” (1941).

O cientista Dr. Ernest Sovac (Boris Karloff) está envolvido num trabalho de pesquisa de transplante de cérebros. Depois que seu grande amigo, o professor de literatura inglesa George Kingsley (Stanley Ridges) sofre um acidente terrível, sendo atropelado por um carro em fuga de uma perseguição com tiroteios, o cientista encontra uma oportunidade de fazer uma experiência para tentar salvar a vida do amigo gravemente ferido com uma lesão cerebral irreversível. O carro acidentado era dirigido pelo gangster Red Cannon (também Ridges), que fugia dos antigos parceiros de crime, após um roubo milionário. Fraturando a coluna no acidente, o criminoso teve partes de seu cérebro transplantadas para o cérebro do professor, numa experiência ilegal em seres humanos, e que o cientista só tinha realizado em animais.

O grupo de gangsters rivais, liderados por Eic Marnay (Bela Lugosi), ainda era formado por Frank Miller (Edmund MacDonald), William Kane (Paul Fix) e Louis Devore (Raymond Bailey). Numa conspiração com a namorada de Red Cannon, Sunny Rogers (Anne Nagel), eles tentam localizar e recuperar o dinheiro roubado. Em paralelo, a personalidade pacífica do Prof. Kingsley oscila drasticamente com a influência da mente do criminoso, que ao assumir o controle transforma-se num assassino, matando violentamente seus rivais e policiais que cruzam seu caminho.

Enquanto a filha do cientista, Jean Sovac (Anne Gwynne), junto com a esposa do professor, Margaret Kingsley (Virginia Brissac), tentam entender e ajudar no conflito de personalidades, o Dr. Sovac se interessa também pela fortuna em dinheiro, que financiaria seus trabalhos de pesquisas, com sua ganância tumultuando ainda mais a confusão gerada pela dupla personalidade do Prof. Kingsley.

“Sexta-Feira 13” tem apenas 70 minutos de duração e é uma mistura de filme policial com elementos de horror e ficção científica como pano de fundo, na ideia do tradicional “cientista louco” com suas experiências para o bem da humanidade, e que tem consequências desastrosas. Nesse caso, o transplante de partes de cérebros foi o responsável pela dupla personalidade do Prof. Kingsley com o gangster Red Cannon, alternando entre um homem pacato e um criminoso assassino, no estilo da clássica e popular história do Dr, Jekyll e Sr. Hyde, “o médico e o monstro” de Robert Louis Stevenson.

O simples fato da presença de Boris Karloff e Bela Lugosi, dois expoentes máximos do cinema de Horror e Ficção Científica, já traz grande crédito para o filme, agregando valor com seus nomes reconhecidos e requisitados na época. Mas, curiosamente eles não contracenam juntos em nenhuma cena no filme, e Lugosi tem apenas um papel menor e secundário, aparecendo pouco como um dos gangsters, enquanto Karloff é o cientista responsável pelo elemento fantástico que gera o conflito na trama. E certamente um destaque é a atuação de Stanley Ridges na interpretação dupla do calmo professor e do inescrupuloso criminoso, simulando personalidades muito distintas de forma convincente.

Informações de bastidores reveladas pelo roteirista Curt Siodmak dizem que Karloff inicialmente ficaria com o papel do Prof. Kingsley e o cientista Dr. Sovac seria interpretado por Lugosi, mas que depois o famoso ator da “criatura de Frankenstein” desistiu da complexidade exigida na atuação de um papel duplo e tomou o lugar de Lugosi como o cientista. O ator de “Drácula” ficou então apenas com uma participação menor como o líder dos criminosos que estão atrás do dinheiro roubado.

Outra curiosidade é que Curt Siodmak é também o autor do conto “O Cérebro de Donovan” (1942), que recebeu algumas versões para o cinema como “A Dama e o Monstro” (1944) e “Experiência Diabólica / O Cérebro Maligno” (1953), cuja história é sobre um cérebro de um homem inescrupuloso morto, mas que é mantido vivo fora do corpo e ainda consegue manipular a mente das pessoas por telepatia.  

(RR – 14/09/20)



 

O Homem do Planeta X (The Man From Planet X, EUA, 1951, PB)

 


A quantidade de filmes bagaceiros de horror e ficção científica produzidos principalmente a partir de meados do século passado é imensa, para o deleite dos apreciadores do cinema fantástico de baixo orçamento. “O Homem do Planeta X” (The Man From Planet X) é um filme americano de 1951 dirigido por Edgar G. Ulmer que deve ser sempre resgatado e reverenciado, não pelas qualidades cinematográficas reservadas para os clássicos, mas pela nostalgia e garantia de entretenimento com mais uma história de invasão alienígena.

Com fotografia em preto e branco, duração curta de apenas 70 minutos (característica comum dos filmes similares de orçamentos reduzidos daquela distante período), um roteiro carregado de clichês e situações para favorecer a precariedade da produção, além de efeitos toscos da nave espacial e do bizarro alienígena humanoide com cabeça enorme, o filme é uma daquelas divertidas tranqueiras que investiam em promoção com posters exagerados com frases de efeito para chamar a atenção para seus elementos fantásticos, que impressionavam as plateias da época.

Na história, o cientista Professor Elliot (Raymond Bond) está com sua jovem filha Enid (Margaret Field) numa antiga torre de pedra localizada numa ilha remota da Escócia. A construção, erguida como proteção de ataques dos vikings, está servindo de observatório espacial para o cientista, que descobriu a aproximação misteriosa de um planeta até então desconhecido, identificado agora apenas como “X”. Ele tem o auxílio do Dr. Mears (William Schallert), um antigo aluno com passado suspeito e reputação duvidosa. E também recebe a visita de um amigo jornalista americano, John Lawrence (Robert Clarke), que informado por outro cientista, Dr. Robert Blane (Gilbert Fallman), sobre a descoberta do planeta ameaçador, decide viajar até a Escócia para investigar o evento. A ilha, sempre envolta em muita névoa espessa, seria o local na Terra mais próximo de um possível contato com o planeta em rota de aproximação.

Certa noite, ao vasculhar os arredores da torre de observação, eles encontram uma nave espacial pousada parecida com um sino de mergulho (a única diferença entre o espaço e a água é a densidade, justifica o Prof. Elliot), e são surpreendidos pelo contato com o alienígena do título (interpretado por Pat Goldin, não creditado), um humanoide com cabeça imensa e rosto com feições distorcidas, que usa um capacete transparente e aparelho respirador acoplado ao corpo, comunicando-se apenas com ruídos.

Após um contato inicialmente amistoso, o alienígena procura ajuda para seu planeta que está congelando, mas a confiança logo é quebrada graças às ações inescrupulosas do ganancioso Dr. Mears, criando um clima de animosidade com o “homem do planeta X”, que passa a usar como forma de retaliação um raio que controla a mente das pessoas. Dessa forma, ele recruta um grupo de escravos agindo como zumbis entre os aldeões de um vilarejo na ilha. Ao instaurar o medo pelo contato entre raças mal sucedido, a confusão acaba despertando a reação da polícia e de um pequeno grupo de soldados do exército que vieram do continente atendendo um pedido de socorro repassado por um navio que navegava próximo à ilha.

A temática da invasão alienígena sempre foi um interessante argumento nos filmes produzidos após o fim da Segunda Guerra Mundial, com seus roteiros influenciados pela paranoia da recém iniciada guerra fria entre os Estados Unidos e a antiga União Soviética, através do medo crescente dos americanos de uma invasão comunista em sua sociedade. O intruso alienígena vindo do misterioso planeta X é considerado uma ameaça, porém com suas intenções ainda em análise. Mas, após contato com o assistente Dr. Mears, que pensa nos lucros que poderiam ser obtidos com o uso de uma tecnologia extraterrestre superior, o confronto é inevitável.

Em “O Homem do Planeta X” iremos encontrar os clichês dos filmes bagaceiros que exploram a ficção científica e horror, com personagens estereotipados como o tradicional cientista que descobre um planeta se aproximando da Terra, sua bela filha que terá um interesse romântico com um jornalista investigativo, além da presença de um vilão ganancioso para tumultuar e gerar os conflitos. Tem os elementos tradicionais indispensáveis como a nave espacial tosca e o monstro bizarro do espaço sideral, um invasor alienígena com feições humanoides que garante a diversão em todas as vezes que aparece em cena. Uma vez sendo uma produção de recursos escassos, as filmagens ocorreram em poucos dias utilizando cenários reaproveitados, e as soluções do roteiro são todas simplórias com resultados previsíveis. E justamente a somatória de todos esses fatores garantem a diversão.      


(Juvenatrix – 13/09/20)